domingo, 30 de novembro de 2014

Lembrete 25


A desatenção é um crime, nestes dias frios, mas luminosos e sem chuva. Porque, se não virmos o que se vai passando na Natureza, é decerto "por andarmos no mundo por ver andar os outros..." - como dizia alguém que eu muito estimei.
Olhe-se a poente, ao fim da tarde. Que os ocasos, a Oeste, estão um esplendor nos seus múltiplos laranjas - nem Turner!...
Os alemães, na sua poética filosófica, dizem que é o reflexo do fogão dos anjinhos, que começaram a fazer os bolos e bolachas, para o Natal...

Citações CCIX


Muitos estão destinados a raciocinar mal; outros, a nem sequer usar a razão; e outros, ainda, a perseguir aqueles que têm razão.

Voltaire (1694-1778).

De G. P. Telemann (1681-1767), música para o Advento


sábado, 29 de novembro de 2014

Advento



Com a devida antecedência, cá está o nosso calendário do Advento, prestes a ser inaugurado, amanhã de manhã, com a abertura da primeira portinha.

Bom Domingo de Advento !

Post de HMJ

E já que falei de F. A. P., aqui vai 1 poema...


Dueto com melro


Este anda toda a manhã às pêras
com uma musiquinha no bico
e ri-se muito quando eu abro
a janela em guilhotina
do escritório

ri-se do verso lambido
diz que o troque
por mais sólidos
apetites de aldeia
                          se pêras não
que posso enfim não gostar delas

vá por amoras ao Telhadouro
vá aos pinhais por camarinhas
e para que escreve o tipo à mesa
com ar tão sério diz ele
deu-lhe agora a terçã?


Fernando Assis Pacheco, 1979.

Marcadores 25


Já por aqui falei do acaso afortunado de, em livros usados que compramos, nos aparecer um marcador interessante, a meio do volume. Foi o caso deste, em imagem, que desentranhei das "Memórias para o ano 2000", de José Augusto França. Que reproduz o início de um poema de F. Assis Pacheco, inserto na página 117 de "Musa Irregular" (Hiena, 1991).

A par e passo 116


Enfim, quantas obrigações! Deveres dissimulados no conforto da sua própria existência! Obrigações de comodidade, as preocupações sobre o dia de amanhã multiplicam-se no dia a dia, porque a organização cada vez mais perfeita da vida nos aprisiona num círculo, cada vez mais apertado, de regras e de constrangimentos de que muitos nem se apercebem. Nem sequer temos consciência de tudo aquilo a que obedecemos. O telefone toca, e logo corremos para ele; o relógio dá sinal, e logo temos que nos apressar para os encontros marcados... Pensemos naquilo que representam, para o nosso espírito, os horários de trabalho, os horários dos transportes, as obrigações crescentes de higiene, até mesmo as regras de ortografia que dantes não existiam... Tudo nos comanda, tudo nos apressa, tudo nos prescreve aquilo que devemos fazer e nos ordena a que o façamos automaticamente. A análise dos reflexos automáticos torna-se o principal exame do tempo actual.

Paul Valéry, in Variété III (pg. 226).

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Não é bem o Cante Alentejano...


...mas vem de lá. E surge aqui para celebrar a sua inclusão recente, pela Unesco, no Património Cultural da Humanidade. Justa e merecidamente.

com os melhores agradecimentos a AVP.

Pinacoteca Pessoal 88 : Picasso (2)


Muitas vezes, o Desenho é considerado uma sub-espécie das artes plásticas. Porque, também, nem sempre se impõe pela qualidade ou parece ter algo de inacabado. E de tentativa ou mero caminho para...
Mas estes três desenhos de Pablo Picasso (1881-1973), feitos nos anos 40/50, retratando Françoise Gilot (1921), deixam-me fascinado pela frescura e simplicidade da sua beleza.


Comic Relief (98)


Também poderia integrar a rubrica "Retro", este sugestivo postal de 1906, enviado do Porto, por A. Fonseca, a 16 de Janeiro, para Monsieur Augusto Madahil, que estava hospedado no Hotel Borges, em Lisboa.

com agradecimentos a H. N. .

Adagiário CCVII


Ódio velho não cansa.

Nella Maissa (1914-2014)


A pianista Nella Maissa, de origem judia, nascida em Turim, mas naturalizada portuguesa, desde 1936, faleceu ontem, em Lisboa. Centenária, pois tinha nascido a 7 de Maio de 1914, Nella Maissa deu o seu último concerto, com 94 anos, em Julho de 2008, na Casa da Música, na cidade do Porto.


Idiotismos 28


A informação vai como veio. Colhi-a no "Lisboa dos nossos avós", de Júlio Dantas, no capítulo em que ele refere os antigos cafés lisboetas, que teriam começado a proliferar pelos finais do século XVIII. Substituindo as "hostarias" e as "hortas" seiscentistas. E que, sendo locais de agrupamentos diversos, aí se trocavam ideias, difundiam boatos e se comentavam, displicentemente, factos políticos e outras novidades - antiquíssimas redes sociais... Onde se cavaqueava, em suma.
E é aqui que entram as palavras de Júlio Dantas: "...segundo ele próprio diz, «cavaquear». Esta palavra, trazida para Portugal, no princípio do século XIX, pelos soldados portugueses que fizeram com Napoleão a campanha da Rússia (parece que kabak significa em russo, botequim ou taberna) define, melhor do que qualquer outra, a função social do café. ..."

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Lembrete 24


Notícia breve do Le Monde (21/11/2014), que me importa destacar, a saída em França, de "As Pequenas Memórias", de José Saramago, na Editora Seuil, através da tradução de Geneviève Leibrich, com o título de Menus souvenirs.
A notícia refere, no final, que se trata de "um relato sensível, e um hino aos humildes".

Scriabin / Luganski


Citações CCVIII


Não há melhor forma de exercitar a imaginação do que o estudo da lei. Nenhum poeta foi capaz de interpretar a natureza tão livremente quanto um advogado interpreta a verdade.

Jean Giraudoux (1882-1944), in La Guerre de Troie n'aura pas lieu.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Um ponto de ordem à mesa


Não sejamos ingénuos ou hipócritas: a figura "presunção de inocência" é uma mera figura de retórica, sem tradução isenta no espírito de cada um. Arrisco mesmo a afirmar que nem sequer na cabeça dos calejados profissionais da justiça, nem nos juízes, pelo menos, nos de bancada...
E não nos iludamos, o presumível arguido inocente, mesmo que depois do julgamento venha a ser absolvido, é um pestífero adiado, logo à partida. Ninguém lhe devolverá a saúde, nem mesmo por caridade cristã. O fanatismo da emoção não é coisa serena e, raramente, é justo. 

Voltando ao assunto das "Ordenações cuniculares"...


Entre a Portaria 244/2014 (Vinhos do Alentejo) e a 246/2014 (Vinhos do Dão), publicada ontem no Diário da República, vai uma diferença de tomo...
Se a alentejana era pródiga e "mãos rotas" na liberalidade anárquica de castas estrangeiras permitidas (26 em 68 totais), a que disciplina a região demarcada do Dão é muito mais criteriosa e circunspecta, porque apenas permite (3 em 42): Semillon, Alicante-Bouschet e Monvedro - que julgo serem não originárias, tradicionalmente, da região do Dão.
De quem será o mérito desta usura? Do sr. Albuquerque não deve ser com certeza...

De Mikael Tariverdiev, uma valsa

Escritores regionalistas (?)


Das suas crónicas jornalísticas reeditadas em livro ("Passos Perdidos", Portugália, 1967?), João de Araújo Correia (1899-1985) começa assim a primeira: "Aquilino Ribeiro é meu vizinho de além do rio..."
Médico, que exerceu em Peso da Régua, Araújo Correia é conhecido e classificado, muitas vezes, como um escritor regionalista, de Trás-os-Montes. O que, de algum modo, é um labéu ou maldição. Como foi para Tomaz de Figueiredo, que centrou boa parte da sua obra no Minho. Ou Loureiro Botas que tomou à sua conta o Litoral (Centro). Fugiu um pouco à sina, Aquilino Ribeiro, apesar das Beiras serem o cenário de muitos dos seus romances e novelas.
Em qualquer dos quatro escritores referidos, os regionalismos são frequentes, sendo a sua riqueza e a sua marca de água. Mas, talvez, também a sua maldição: parece que apressam o seu esquecimento...

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Advento



Atempadamente, antes do próximo Domingo, 1º do Advento, recebemos, por gentil oferta familiar, a coroa do Advento reproduzida acima. O difícil foi arranjar um espaço suficientemente grande, na zona onde costumamos tomar as refeições, para acolher esta "roda" enorme. 
Ao que parece, também está no caminho um calendário do Advento que uma mão amiga nos faz chegar todos os anos. 
Assim, a partir do próximo Domingo, já posso cantarolar a lenga-lenga do costume: "erst eins, dann zwei, dann drei, dann vier, dann steht das Christkind vor der Tür !" [qualquer coisa como: primeiro uma, depois duas, depois três, depois quatro - claro está velas/luzes - e, então, aparece o Menino Jesus !]

Post de HMJ

Regionalismos transmontanos (63)


1. Quadraçal - o granito, quando na pedreira.
2. Queira - matilha.
3. Queiro - diz-se do dente do siso.
4. Querica - frigideira.
5. Quilhão-de-galo - casta de uva de mesa, de bagos rosados, oblongos e grandes. (Também conheço na versão soft de: dedos-de-dama.)
6. Quodório - pequena porção de vinho ou café com aguardente.

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Ordenações cuniculares


Como se teriam, livremente, organizado as coisas, neste caso as castas de uvas, desde o início dos tempos, quando agora parece ser imperioso e administrativo arrumá-las por Diário da República?
Se a Baga é retintamente bairradina, também a branca Alvarinho foi, até há bem pouco tempo, exclusivamente alto-minhota (e galega, valha a verdade). Bem como a Antão Vaz, genuinamente alentejana. Não está em causa a razão disciplinar da portaria (244/2014) do Ministério de Agricultura, o que eu acho é que o seu conteúdo é um autêntico "albergue espanhol", querendo meter o Rossio na Betesga, neste caso nas vinhas alentejanas. Nada menos de 68 castas, incluindo a Baga bairradina e, pasme-se, nada menos de 26 castas estrangeiras, que vão da Zinfandel à Nero-d'Avola, passando pela Sangiovese, para que o vinho possa ostentar a denominação: Alentejo...
Num país como o nosso que, na Europa, é um dos que maior diversidade de castas autóctones possui, esta portaria globalizante parece-me um enorme disparate. Uma autêntica corrida cega para a descaracterização de uma região vinícola demarcada.

Revivalismo Ligeiro CIV


Uma fotografia, de vez em quando (50)


Nascido em Detroit, em 11 de Junho de 1934, o fotógrafo norte-americano Jerry Uelsmann é considerado um precursor da fotomontagem. Mas não deixa de lembrar, numa outra via, o pintor belga René Magritte...


domingo, 23 de novembro de 2014

Retro (58)


Uma imponente pose de dois grandes escritores russos: Tolstoi e Gorki.

Por arrasto


Veio à colação associativa o título Guerra e Paz - em livro -, porque também titulava o colóquio do Nexus Institute, onde a pianista Tamar Halperin (1976), sob o olhar suspenso mas apreciativo de Andreas Scholl, interpretava Alessandro Marcello (e que linda peça musical, não percam!...), inserto 3 postes abaixo, aqui no Blogue.
Ora trancreva-se, então, o pequeno trecho de "Guerra e Paz" e em palavras de Leão Tolstoi:
"Davout era o Araktcheiev do imperador Napoleão. Com a diferença de não ser poltrão, era meticuloso como o seu émulo russo, como ele cruel e incapaz de provar a sua dedicação ao senhor de outra maneira que não fosse pela crueldade.
Nos rodízios de um Estado são necessários tais homens, como são necessários os lobos na natureza; existem sempre, sempre eles se mantêm, por mais absurda que possa parecer a sua presença junto dos chefes do Estado, ou a sua intimidade com eles. Por esta absurda necessidade pode explicar-se como é que esse cruel Araktcheiev, que arrancava, com as suas próprias mãos, o bigode aos granadeiros, incapaz, aliás, por fraqueza nervosa, de afrontar o menor perigo, como é que esse homem, sem cultura, destituido da menor polidez, pôde conservar tamanha influência na natureza nobre, cavalheiresca e terna de um Alexandre? ..."
( Guerra e Paz, volume II, página 230)

Em prosa (poética?) repentina, ao jeito de Prévert, e sem auto-crítica sequente


O castanho, sobretudo o mais pálido,
acaba por nos ser consensual
na sua amenidade prática e tranquila
de Outono. Mas há também um fogo rubro
nas folhas suicidas que se despem ou despedem
dos seus ramos, para a nudez tosca de Dezembro.

Há mistérios na Natureza que não convém desvendar,
como no amor - pelo seu encanto singular.
Nem os poetas sabem ao certo,
embora suspeitem,
que vão deixar de cantar.
Os números exactos não são o seu forte.

Nem sequer as certezas.



Sb., 23/11/2014.

Citações CCVII


A razão sem as paixões seria quase um rei sem súbditos.

Denis Diderot (1713-1784).

sábado, 22 de novembro de 2014

Alessandro Marcello / Tamar Halperin


Inicialmente atribuída a Benedetto Marcello, na transcrição de J. S. Bach do Concerto para Oboé, esta obra musical terá sido escrita pelo irmão, Alessandro Marcello (1684-1750).

Duas capas de Leal da Câmara


O pintor português Tomás Júlio Leal da Câmara (1876-1948) foi também um inspirado caricaturista e ilustrador. Por razões políticas, passou alguns anos em Paris.
L'Assiette au Beurre, revista satírica francesa, de inspiração anarco-marxista, fundada por Samuel-Sigismond Schwartz, judeu húngaro naturalizado francês, teve uma vida intermitente e publicou-se entre 1901 e 1936. Contou com a colaboração de Anatole France e teve ilustradores de qualidade: Félix Nadal, Benjamin Rabier e Juan Gris, entre outros. Leal da Câmara teve, também, uma colaboração assídua e vasta em L'Assiete au Beurre. São dele as duas capas, em imagem: uma representando o rei D. Carlos (1905) e a segunda o rei de Espanha Afonso XIII.


A infância é um território inocente e verdadeiro


Perante as notícias que, hoje, fazem a primeira página dos jornais portugueses, qualquer poste é uma minudência inútil, o avo que, nas palavras cruzadas, ocupa o espaço de três casas.
Um artigo, que li no TLS, sobre as casas pré-históricas da Inglaterra garantia que, ao contrário das europeias do Continente, elas eram circulares, na sua forma; bem como afirmava que as portas de todas elas estavam viradas a sudeste, por causa do Sol e do acordar dos seus habitantes. Se, sobre esta última afirmação, eu nada tenho a contradizer, já sobre a circularidade única das pré-históricas palhotas britânicas, posso contraditar que, também na antiga Lusitânia, a forma dos casebres era circular. Até porque as visitava, na Citânia de Briteiros, nos setembros da minha infância, em piqueniques familiares tradicionais que se faziam, na proximidade do parque arqueológico. E lembro-me bem delas...
Para quem as não conheça, aqui vão na imagem que antecede este poste.

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

A par e passo 115


Enfim, as condições da vida moderna tendem inevitável e implacavelmente a igualizar os indivíduos, a igualizar as características; e, infeliz e necessariamente, é para o tipo mais baixo que a média tende a reduzir-se. A má moeda expulsa a boa.
Outro perigo: apercebo-me que a credulidade e a ingenuidade sofrem um desenvolvimento inquietante. Observo, desde há alguns anos, um novo conjunto de superstições que não existiam, aqui há vinte anos, em França, e que foram sendo introduzidas, mesmo nos salões. Vêem-se pessoas distintas a bater na madeira das cadeiras e a praticar actos esconjuratórios. Além disso, um dos traços mais chocantes do mundo actual é a futilidade; e posso dizê-lo sem me arriscar a ser demasiado severo: nós estamos divididos entre a futilidade e a inquietação.

Paul Valéry, in Variété III (pg. 225).

Bibliofilia 113


Um dos articulistas do TLS, com regularidade cíclica, propõe-se a si mesmo um desafio, de tempos a tempos: até um limite de 5 libras inglesas, e percorrendo vários alfarrabistas, encontrar um livro interessante e comprá-lo, dentro desse orçamento. Desta vez (TLS nº 5824), em Hammersmith, na Books for Amnesty, conseguiu adquirir, em segunda mão, o volume Marcel Proust: An English tribute (Chatto & Windus, 1923), de C. K. Scott Moncrieff, pelas tais 5 libras.
Nunca me abandonei a estes estados de alma, mas considero esse exercício, no mínimo, curioso. Ontem, e como faço com alguma periodicidade, visitei o meu alfarrabista de referência, na rua do Alecrim, onde ultimamente a oferta tem sido escassa. No meio das poucas coisas novas, à venda, encontrei o livro de Júlio Dantas (1876-1962), em imagem, que descreve antigos usos e costumes alfacinhas (touradas, procissões, Carnaval...). Marcado por 6 euros, venderam-mo por 5.
Como a "colheita" fora diminuta, na mesma rua, algumas portas abaixo, entrei num segundo antiquário que, recentemente, alargou de forma substancial a sua secção de livros usados. Os preços eram outros: consideravalmente mais altos. E, para minha grande surpresa, também ele tinha o "Lisboa dos nossos avós", na mesma edição de 1969, promovida pela C. M. de Lisboa, só que pedia pelo livro uns "puxados" 15 euros!...
Considerei-me um felizardo. E já comecei a ler a obra que, na sua prosa elegante, é muito instrutiva e interessante. Embora não seja rara.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Nina Simone (1933-2003)

3 títulos para o estado da Nação


 Do jornal Público, de hoje, passo a transcrever:

1. "RTP tira Liga dos Campeões à TVI em negócio de (18) milhões (de euros)."
2. "Campanha de Cavaco gastou 25 mil euros para oferecer 110 relógios (Tissot) a colaboradores." 
3. "Galp prepara novo braço-de-ferro com o fisco em Dezembro." (Estão em causa 35 milhões de euros de cobrança.) 

Comentário sucinto: eu creio que devem andar por aqui alguns fora-da-lei...

A mentira e os outros, segundo Fellini


Eu sou um mentiroso, mas sou sincero.
Censuram-me por não contar sempre da mesma maneira a mesma história. Mas isto acontece porque, à partida, fui eu que inventei toda a história e me parece muito aborrecido e nada gentil, para com os outros, eu estar sempre a repetir-me.

Federico Fellini (19920-1993).

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Divagações 76


Há uma cultura formal que é de bom tom manusear, a informal, ou especializada e temática, que vai um pouco mais longe e reserva, quase sempre, surpresas; e há, ainda, a cultura marginal cultivada pelos regionalistas, que também os elitistas disfarçados gostam de exibir. De alguma forma, é assim que se acantona um escol de eleitos.
Do apuro do dia, feito à noite, grande parte se perde. Uma boa fracção das experiências consome-se por si, no próprio acto do seu uso. Outra parte sofre uma triagem da memória que a arruma em dois níveis. Um nível de retenção permanente, para utilização, outro (sub-consciente?) que pode vir à tona, inesperadamente, numa situação de necessidade futura. Para ser usada.
Francamente não sei como se armazenam, diariamente, os sentimentos. Talvez venham a ser dissolvidos em sonhos...

P. S.: o quadro (1981), em imagem, de Jasper Johns (1930), intitula-se: "Between the clock and the bed".

Retro (57)


E antes que se acabe o ano do centenário do começo da I Grande Guerra, aqui ficam dois gentis Poilus, mai-las suas airosas namoradas

Georg Philipp Telemann (1681-1767) : Tafelmusik

terça-feira, 18 de novembro de 2014

O Fundo do Baú



Quando em Junho do corrente ano falava num “post” sobre “Uma Oferta Singular”(10/6/14) não imaginava que a vontade me ajudasse tanto. Mas aconteceu, e o baú dos panos ficou vazio. O linho caseiro transformou-se em toalhas, pequenas ou maiores, e individuais.

O “rolo” de tecido de algodão, ca. de 6,50 m, ficou para o fim após ter servido, uma parte ínfima, para a blusinha da boneca. No fim-de-semana lembrei-me, então, novamente do tecido e de uma prática, saudável, na época pré-natalícia, quando o tempo sugeria recolhimento e as horas vagas eram preenchidas com a feitura de presentes.

Os metros de tecido de algodão, juntamente com as aplicações várias deram o pontapé à imaginação: que saia um toalha de mesa ! Único senão foi o facto de o tecido ter apenas 0,80 m de largura. Os livros de costura deram a solução, ou seja, uma bainha que permitia juntar duas faixas. E o resultado pode ver-se na imagem acima. Para tapar a bainha e embelezar a toalha, lá ficou a aplicação a marcar o centro da mesa.




Ainda sobrou matéria-prima para aproveitar, até ao fundo, o baú e concluiu-se o trabalho com uma toalha mais pequena, que se apresenta na segunda imagem, pronta para enfeitar a mesa do almoço antes de ir para a máquina de lavar.

Post de HMJ, dedicado a A.de A.M.

Citações CCVI


Todos os impérios (incluindo o otomano) se regularizaram  sobre os territórios. Apenas o imperialismo ocidental se desdobrou em expedição e expansão ilimitadas.

Jean-Luc Nancy (1940), in Le Monde, de 7/11/14.

Curiosidades 34


Não me impressionaram, favorável e particularmente, grande parte das obras da artista (?) e fotógrafa inglesa Julie Cockburn (1966), que se dedica à manipulação, alteração artesanal e colagem sobre velhas fotografias, ou outros objectos. Mas achei muito interessante esta versão nova do livro "A book of Beetles" (Londres, Spring Books, 1965), de Joseph Rudolph Winkler, que Julie Cockburn enriqueceu, em 2002, recortando e introduzindo, pelas páginas da obra, vários insectos e carochas.
E até me lembrou o Herbário que constituí, para efeitos escolares, na minha adolescência.
Por isso, aqui fica a imagem dessa obra de Julie Cockburn.


Adagiário CXCIV


E como está quase na hora do almoço:

"Tenhamos a pata e então falaremos da salsa."

Nota: desenganem-se, porém - não vai ser este o meu almoço.

Revivalismo Ligeiro CIII : Marino Marini (2)


Vai-se o gosto apurando com o tempo, o sentimentalismo juvenil couraçando-se de cepticismo, quando não de indiferença emocional. Mas é um facto que, nos anos 50/60 do século passado, e em Portugal, o conjunto musical italiano de Marino Marini (1901-1980), era uma referência para grande parte dos adolescentes de então.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

O "Sr. do Tempo"


Corre o Arpose o grave risco de, neste mês de Novembro, se tornar num quase mero obituário acidental.
Kronos, porém, é um Titã caprichoso e persistente: não reconhece nem Senhores, nem Mestres. E a morte há-de ser sempre o objectivo principal, ou único, na sua conclusão cruel.
Conheci, pessoalmente, o açoriano Anthímio de Azevedo (1926-2014), talvez o metereologista mais célebre das televisões portuguesas. Acontece que ele foi um dos elementos fundadores, nos anos 40, de uma instituição que acolhia, em Lisboa, jovens universitários, vindos da província, por onde eu passei nos anos 60 do século passado. Todos os anos, no início deste mês de Novembro, nos reuníamos, jovens e velhos, antigos e novos, para celebrar a instituição, vagamente e cada vez menos, ligada ao Patriarcado.
Anthímio, que faleceu hoje, era um dos mais conviventes, afáveis e entusiastas dos 5 sobreviventes fundadores. E católico ferventíssimo, cada vez mais pertencendo a uma minoria que, para os mais novos, quase parecia exótica.
E, com certeza, um dos temas da conversa era a passagem do tempo...

Regionalismos transmontanos (62)


1. Pingacho - dança mirandesa.
2. Pinguelo - rapaz ou rapariga palerma.
3. Presigo - aquilo que se come com o pão, bocadito de carne cozida, conduto.
4. Proento - vaidoso, peneirento, presunçoso.
5. Proviscar - provar aos poucos, depenicar, mordiscar.
6. Puxavante - que puxa, que suscita, que provoca, que leva a.

domingo, 16 de novembro de 2014

Uso Pessoal 10


A lenda do chinês das gravatas


Chinês.

A paciência de vender da gravata
até à última.

Chinês.

A paciência de caçar da mosca
até à última.

Chinês.

Fúngala! Fúngala!

Dizíamos nós, meninos,
esfregando o nariz entre o médio e o indicador,
enquanto saltitávamos em torno do chinês das gravatas,
numa grande assuada.

Fúngala! Fúngala!

E então ele saiu de Portugal, voltou à China
e caçou da mosca até à última.


Gostei, e ainda gosto muito de gravatas. Só que hoje já as não uso, a não ser em funerais, uma preta, que não consta da imagem abaixo. Mas já tive à volta de 50; agora terei cerca de uma dúzia.
Para se compreender melhor o poema de Alexandre O'Neill, transcrito acima, será preciso lembrar que, em Portugal, em meados do século passado, havia vendedores ambulantes de gravatas. Os preços delas oscilavam entre Esc. 7$50 e 15$00. E, em Coimbra, no início dos anos 60, havia, pelo menos, 2 chineses (macaístas?) que vendiam gravatas pelas ruas e cafés. Lembro-me que comprei algumas por lá. Hoje, os chineses já não devem vender gravatas, mas compram edêpês...
E aqui fica, em seguida, um pequeno mostruário selecionado, em imagem, de quatro  das poucas gravatas que ainda tenho, mas rarissimamente uso.




Philip Glass / Maki Namekawa


sábado, 15 de novembro de 2014

Antecedentes do Ginásio



De facto, estamos sempre a aprender. Só ontem, através de um livro publicitado no DIE ZEIT sobre a Revolução Industrial, soube que as actuais maquinetas que invadem os ginásios já tinham antecedentes de "peso" e "glória", datadas de 1924.
Como se vê pela imagem acima, até havia uma "bucha" e uma "estica" a vigiar o desempenho das demais criaturas.
Gostei imenso das fatiotas, com destaque para os calções que, juntamente com sapatos de salto alto, poderiam servir de modelo a algumas criações modernas.
Enfim, nada se perde, tudo se transforma !

Post de HMJ

Testemunhos da Resistência (M. U. D.)


Fundado a 8 de Outubro de 1945, após a vitória dos Aliados, na II Grande Guerra, o Movimento de Unidade Democrática (M. U. D.) foi um dos mais importantes agrupamentos políticos de oposição e resistência à ditadura do Estado Novo. Foram seus fundadores, entre outros, Teófilo Carvalho dos Santos, António Luís Gomes e José Magalhães Godinho, a que aderiram velhos republicanos: Azeredo Perdigão, Manuel Mendes... Nele se integraram jovens democratas tais como Maria Lamas, Mário Soares, Bento de Jesus Caraça e Alves Redol.
As vinhetas, em imagem, destinavam-se, com a sua venda, à angariação de fundos para as actividades políticas do M. U. D..

com os melhores agradecimentos a H. N..

Contra-cultura


Para o homem comum um par de botas conta muito mais do que as obras completas de Shakespeare ou de Puchkine. 

Dmitry Pissarev (1840-1868).

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

Acordar no Paraíso


Convém lembrar, neste caso, o dito popular: "não digas desta água não beberei."
Porque, se a foto é do Metro de Tóquio, já me aconteceu a mim , algumas vezes, adormecer no transporte público, na ida para o trabalho. Sentado, é certo. Mas o problema é que, numa das vezes, só acordei na estação seguinte...