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segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Esquecidos (18)

 

Soube, há pouco tempo, que um colégio lisboeta de referência, em relação à literatura portuguesa do século XIX, incluia no seu programa escolar apenas o estudo de Eça de Queiroz. Quanto ao século XX são contemplados unicamente Pessoa e Saramago. O panorama  público de ensino não será muito diferente... Perde-se assim um enquadramento e contexto temporal e cronológico de autores, bem como se soterram no esquecimento a maioria dos escritores nacionais. Mas creio que também Teixeira de Pascoaes (1877-1952), um mal-amado, nunca pertenceu ao cânone português das escolas. Muito embora tivesse merecido importantes estudos de Jacinto do Prado Coelho, Jorge de Sena, Mário Martins, Alfredo Margarido, entre outros ensaístas.
Prado Coelho refere a infância como sendo o tema central na sua obra poética, eu optaria antes pela temática da morte como omnipresente nos seus versos. Não sendo um modernista, a poesia de Pascoaes retém acentos de algum romantismo e, sobretudo, sinais de um simbolismo original e panteísta que difere muito do estilo da obra excessivamente marcada e artificiosa de Eugénio de Castro (1869-1944).
Como contributo de lembrança, aqui deixo um poema de Terra Proibida (1899):

Hora Final

Aí vem a noite... Sente-se crescer...
E um silêncio de estrelas aparece.
Quem é, quem é, meu Deus, que empalidece
E se cobre de cinzas, no meu ser?
Alma que se desprende numa prece...
Que suave e divino entardecer!
Como seria bom assim morrer...
Morrer, como a paisagem desfalece,
Morrer quase a sorrir, devagarinho.
Ser ainda do mundo pobrezinho
E já pairar, sonhando, além dos céus,
Morrer, cair nos braços da ternura;
Morrer, fugir, enfim, à morte escura,
Sermos, enfim, na eterna paz de Deus!

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Ultimas aquisições (39)



Descendo quase em linha recta do recanto da Padaria das Mercês, no Bairro Alto, onde ainda se fabrica e vende o dito sério e "pão honesto" de Cesário, em direcção ao Calhariz, vamos entrar, ao lado do elevador da Bica, na minha velha e bem conhecida Livraria Antiquária de José Manuel Rodrigues. Que, ontem, não estava lá, representado e bem, no entanto, pela sua filha Catarina.
Das estantes e mesas, após cuidada visita, de lá vieram dois poetas estimáveis: Pascoaes, em estudo competente de Alfredo Margarido, e Agostinho da Cruz, arrábido quinhentista, com um pequeno cancioneiro semi-inédito. Custaram-me 10 euros e já comecei a folhear os livros, com agrado.



segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Saint-John Perse


"...Solidão! o ovo azul que um grande pássaro marinho põe, e as baías de manhã completamente atulhadas de limões de ouro! - Era ontem! O pássaro desapareceu!
Amanhã as festas, os clamores, as avenidas plantadas de árvores de vagens e os serviços de inspecção das limpezas arrancando à aurora grandes pedaços de palmas mortas, bocados de asas gigantes... Amanhã as festas,
as eleições de magistrados do porto, os vocalizos nos arrabaldes e sob as mornas incubações de tempestade,
a cidade amarela, coberta de sombra, com as suas calças das raparigas às janelas. ..."
(Saint-John Perse, in Anabase, tradução de Carlos Cunha e Alfredo Margarido)

Marie-René-Auguste-Alexis Saint-Leger Leger nasceu em Guadalupe, a 31 de Maio de 1887, e veio a falecer a 20 de Setembro de 1975, precisamente há 35 anos. Diplomata de profissão, poeta sob o nome de Saint-John Perse, foi prémio Nobel de Literatura, em 1960. No seu discurso de agradecimento referiu: "...Através do pensamento analógico e simbólico, pela iluminação longínqua da imagem matricial, e pelo jogo das suas correspondências, por entre cadeias de reacções e de estranhas associações, pela graça enfim duma linguagem onde se transmite o movimento próprio do Ser, o poeta foi investido de uma superrealidade que não pode ser igual à da ciência. ..."
Poesia de ampla respiração, por onde perpassa um sopro bíblico de ancestralidade e profecia, a obra de Saint-John Perse assimila, em si, a alacridade colorida dos Trópicos ao realismo racional da melhor tradição clássica europeia. Num movimento perpétuo encantatório que se cruza, tangencial, com a imaginação atenta do leitor. É um dos grandes poetas do séc. XX (Anabase, Éloges, Vents...) e, por isso, o lembro - hoje e aqui.