Talvez eu não tivesse sido o mesmo, em relação à Ópera, se não tivesse ouvido, na adolescência e na Póvoa, a voz inconfundível do tenor monegasco Alain Vanzo (1928-2002) a cantar a ária Je crois entendre encore da ópera Les Pêcheurs de Perles, de Georges Bizet (1838-1875), que me havia de encantar para sempre.
Apesar de, no canto lírico clássico, eu já me ter iniciado pelo barbeiro sevilhano de Rossini, mais estridente embora...
Em contraponto feminino mais antigo, Mirella Freni (1935) chegou logo a seguir, e Aafje Heynes (1924-2015). Fischer-Dieskau (1925-2012) veio também a integrar as minhas preferências. Recentememente, Cecilia Bartoli (1966) ocupou um lugar destacado. E, como não podia deixar de ser, Maria Callas terá sempre um lugar cativo (1923-1977).
Da EMI Classics, estes registos são de 1954 (Norma), remasterizado em 1997, e da ópera de Gluck (1957), aperfeiçoado em gravação de 1998.
Eu creio que terá sido em finais dos anos 50 que eu assisti à primeira Ópera, completa e ao vivo. Improvavelmente, integrada nos Festivais Vicentinos, no pátio dos Paços dos Duques de Bragança, numa cálida noite de Verão, em Guimarães. Ia, na presidência da autarquia, o esclarecido e culto Dr. Castro Ferreira, pai do meu grande amigo Chico, já falecido. Provavelmente, no programa cultural previsto para esse ano, teria sido ajudado a concebê-lo por outro médico, de grande craveira intelectual, embora mais discreto de feitio - o Dr. Carlos Saraiva. Também ele pai de outro grande amigo meu, felizmente, este, ainda vivo e de boa saúde, que é da minha colheita cronológica, em idade.
Sabia eu lá, noviço e adolescente, quem era Gioachino Rossini (1792-1868)!? A ópera era, nada mais nada menos, que "O Barbeiro de Sevilha", de que eu gostei imenso, na altura. Mais tarde, talvez em 1963 ou 1964, já em Lisboa, ali pela Av. Miguel Bombarda, Rossini viria a cruzar-se comigo, de forma avassaladora, através de um LP maravilhoso. Com as suas aberturas de ópera, mais famosas e tonitruantes. Até porque vibravam em uníssono com a minha tumultuosa juventude, como todas sempre abertas ao excesso, ao heroísmo, ao tom épico da vida a acontecer. Vim a saber depois, que Rossini fora também um homem generoso, amigo do seu amigo, gastrónomo nato. E bom cozinheiro.
Descobri, ainda mais tarde, que o grande compositor italiano tinha, também, composições musicais de grande finura e sensibidade, como esta:
Acrescente-se, porém, que também os grandes génios podem errar. Rossini, bissexto de nascimento (29 de Fevereiro de 1792), encontrou-se, em 1822, com Beethoven, que lhe deu um conselho prudente, assim: "Ah! Rossini. Então foi você que compôs «O Barbeiro de Sevilha». Dou-lhe os meus parabéns. É uma obra que será sempre tocada e cantada, enquanto houver ópera em Itália. Mas não tente compor nada que não seja opera buffa; qualquer outro estilo não vai bem com a sua natureza."