No prefácio "Às Leitoras" e, no recuado ano de 1898, Beatriz Nazareth, logo no início do seu "Manual de Civilidade e Etiqueta", referia: "Tudo muda com o tempo, mas muito mais na apparencia que na realidade, pelas formas mais que pelo fundo..."
O último TLS (nº 5761) informa que, ainda há 60 anos, escritores como Norman Mailer, Henry Miller e James Jones eram alertados para não usar, em obras a publicar, aquilo que, eufemisticamente, era referido como "the F-word" ou "a four letter word" (que não era love, com certeza).
Mas - e digo eu - a partir dos anos 60/70, a cartografia escatológica norte-americana, apesar de todo o puritanismo farisaico de fachada, começou a entrar em força, sobretudo através do cinema, no dia a dia europeu. E até Philip Larkin, um comedido poeta britânico laureado, utilizou a palavra proscrita num poema - para escândalo, ainda, de alguns ingleses serôdios e vitorianos...
Cá, pela terrinha, depois das diatribes desbragadas de Raul Leal, da fulgurância exclamativa de "A Cena de Ódio" de Almada (que não tem só versos para criancinhas...) e do célebre "merda, estou lúcido!" de Pessoa, o consulado salazarista foi reconstruindo a moral. Mas com a Liberdade, alguns ganapos atrevidos, mais para ganhar fama rapidamente, e proveito, por via dos pacóvios saloios, começaram, a torto e a direito, a usar a palavra proibida, até no título dos livros. E até cantores fizeram bom uso financeiro dela... numa forma básica de exibicionismo infantil.
Perdeu-se o efeito. Hoje, o "F...-.." é perfeitamente banal ou vulgar em livros e apenas televisivamente, talvez para não chocar famílias reunidas, a expressão é substituida por um silvo casto e desagradável, que todos sabemos o que significa.
"Tudo muda com o tempo", dizia, com toda a razão, a excelsa senhora Beatriz Nazareth...