quarta-feira, 5 de maio de 2010

Greguerías



Greguería, palavra castelhana, é uma espécie de jogo de palavras, ou metáfora em prosa, dito de espírito, normalmente, com comentário humorístico sobre a realidade. Por vezes, parece um aforismo, outras quase lembra um hai-kai em prosa. A sua criação, ou nome de baptismo, é atribuido a Ramón Gómez de la Serna (1888-1963), na segunda década do séc. XX. Este truculento escritor é autor de cerca de 10.000 greguerías, além de obra vasta em vários domínios literários. Damos, em seguida, alguns exemplos de greguerías da autoria de Gómez de la Serna:
1. "A cidra queria ser «champagne» mas não o pode ser porque nunca foi ao estrangeiro."
2. "As pirâmides são as bossas do deserto."
3. "As passas são uvas octogenárias."
4. "O «Pensador» de Rodin é um jogador de xadrez a quem retiraram a mesa."
5. "O caracol devia tocar o trombone que leva às costas."
6. "A água não tem memória, por isso é tão límpida."
7. "A couve-flor é um cérebro vegetal que nós comemos."
8. "A girafa é um cavalo alargado pela curiosidade."
9. "A verde lagosta põe-se vermelha de cólera quando a fervem."
10. "Dante ia todos os sábados à barbearia para que lhe aparassem a coroa de louros."

13 comentários:

  1. Adoro-as. Em tempos, pus umas no Prosimetron. Mas não sabia que ele tinha escrito tantas... Só conheço a selecção que o Jorge Silva Melo fez para a Assírio & Alvim.

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  2. O quadro é lindo e as greguerías são fantásticas! Não conhecia. Julgo que, no flamengo, há uma dança com este nome, mas não fazia ideia que também era um quase «género literário». Obrigado!

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  3. ...e em 2012 a gregueria faz um século.
    Quem não gosta ?
    Mas, como estava com a mão na massa – sem querer ferir eventuais susceptibilidades – dedicando à visita de S.S. Eminentíssima na Sua Infalibilidade:

    De los milagros

    Milagro no es dar vida al cuerpo extinto
    Ni luz al ciego, ni elocuencia al mudo,
    Ni convertir el agua en vino tinto...
    El milagro es creer en eso todo.

    Mario Quintana

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  4. Não me recordo de termos sido felizes. O 25 e Abril abriu as parangonas dos nossos testemunhos mútuos, mas a festa durou, apenas, pouco mais de ano e meio. A euforia termina sempre na indolência,outro modo de resignação.
    Desde que me recordo vivi cercado pela crise, mas, também, pelos acenos dos “amanhãs que cantam”.Com este ou outro estribilho, os homens admitem o sofrimento e, às vezes, até, a abjecção das épocas, na esperança de que o futuro será melhor.
    Talvez eu seja um pouco tonto, talvez, ou um teimoso obstinado e caturra; porém, continuo a acreditar no surgimento de outra coisa que substitua esta selvajaria sufocante.
    Acordamos e deitamo-nos sob a pressão da catástrofe iminente. A imprensa, as rádios e as televisões encharcam-nos de medo e de desassossego, a moderna aptidão para se abraçar um certo estado de vida.
    Viver no medo e no desassossego foi a ideologia dominante nos cinquemta anos salazaristas.
    Um medo e um desassossego larvares, prolongados, depois,pela natureza canibal de uma economia, que assaltara de mão armada, a política, e ameaça a a saúde da democracia. Como, aliás, se vê por aí.(...)
    Chegamos a uma situação perigosa. O papel essencial do trabalho,na sociedade, é desprezado por uma laia dirigente, emproada e vil, ignorante da experiência da história, e que não sabe redefinir as bases do contrato social.(...)
    “Quem nos ajuda?” Ninguém.Com esta Europa,com este,e outros ruinosos governos, cheios de piedade sentenciosa e de explicações superficiais, nada há a esperar.
    Resta-nos a fúria da nossa repulsa e aforça imparável da nossa revolta.

    Baptista-Bastos in Diário de Notícias, hoje, 5.5.2010

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  5. Ministério das Perguntas Cretinas
    Diário Popular
    Lembram ?

    Você ri com a graça de Deus?
    È verdade que há presos que dormem a sono solto’
    Um desmaio pode acontecer em Junho?
    Quando há um terramoto as amizades ficam estremecidas?
    Pode passar-se as noites em claro mesmo quando falta a luz?
    Um músico pode ser preso por emitir notas falsas?
    Os dermatologistas têm sensibilidade à flor da pele?
    O filho do dentista é um garoto incisivo?
    Os filhos do fotógrafo são uma revelação’
    Uma galinha tem pena da outra?
    A mulher do actor de teatro, quando ele chega tarde, faz uma cena?
    A mulher do actor é um espectáculo?

    À dúzia... Millôr Fernandes

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  6. Peço desculpa, baralhei-me (duplamente, aliás).No flamenco (e não flamengo) não existem «greguerías» mas sim «alegrías». As minhas desculpas.

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  7. Para MR: Não me lembrava das do Prosimetron. Espero não ter repetido nenhuma. Mas, para que conste,declaro que fui eu que as traduzi do original (Biblioteca Anaya,nº51,1963).Também gosto muito do quadro,MR, só que não consegui identificar o Pintor.

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  8. Acho que não houve repetições, mas também não tinha importância. E gostei imenso deste seu post.

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  9. Para c.a.: Como gosta(creio) de J.L.Borges,devo dizer que ele atribuía a um françês (só me lembro que morreu em 1910)a origem da gregería, mas também não sei com que fundamento. Se calhar não gostava do De la Serna...

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  10. Para o Luís: Obrigado pelos seus contributos e partilha. Eu acho que estamos já numa fase em que se torna necessário lutar contra o medo, em nome da liberdade que ainda existe. Mas o que tenho acompanhado da Grécia, não me está a agradar nada.

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  11. Gregueria (de griego)f. Vocerio o griteria confusa de la gente. 2 Agudeza, imagen en prosa que presenta una visión personal, sorprendente y a veces humorística, de algún aspecto de la realidad, y que fue lanzada y asi denominada hacia 1912por el escritorRamón Gómez de la Serna.
    Griego (...)7.fig.y fam.Lenguage ininteligible ...

    Dicc. de la Real Academia Espanola

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  12. O referido por Borges é Pierre-Jules Renard (1864-1910, a 22 de Maio) autor de Poil de Carotte, e a quem se atribui Cultura é tudo o que fica depois de tudo esquecer.
    Li o Poil de Carotte mas não me lembro de nada.
    Deste: A mulher é um formoso animal sem pelo cuja pele é muito apreciada.
    Prefiro o Gómez: os zeros são os ovos donde nascem os algarismos

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