quarta-feira, 23 de julho de 2014

As diferentes perspectivas


Por mero acaso, e num espaço de pouco mais de 24 horas, tive conhecimento noticioso de 4 métodos ou perspectivas de encarar os reclusos: em Portugal, no Brasil, em França e na Inglaterra. Países que, todos eles, se debatem com o problema da sobrelotação das cadeias. E que o procuram mitigar. Assim:
1. o jornal Público, na sua edição de ontem, como se pode ver pela imagem, titulava a questão logo na primeira página. O título é que me parece mal enjorcado e presta-se a confusões de interpretação...
2. no "Obs." (nº 2593) colhi a informação de que, pelo menos numa prisão brasileira (Catanduvas), os reclusos são desafiados a ler um livro por mês e fazer o seu resumo respectivo. Por cada livro lido e resumido, terão uma redução de pena de 4 dias;
3. na mesma revista, dá-se notícia que a ministra da Justiça francesa, Christiane Taubira, apresentou, no Parlamento, um projecto de reforma penal em que se propõe, em relação aos presos que aceitem participar em actividades culturais, nomeadamente, leitura, que, em contrapartida, venham a ter, também, uma diminuição de pena;
4. ainda do "Obs.", em Março último, Chris Grayling, ministro da Justiça britânica, proibiu expressamente que os reclusos recebessem de ofertas ou encomendas exteriores os seguintes produtos: livros, selos, lápis e papel. Podendo, no entanto, adquiri-los no interior das prisões. "Para acelerar a sua reabilitação" - justificou-se ele.
Não quero fazer qualquer juízo de valor sobre a bondade destas diferentes medidas. As diversas perspectivas, que estão por trás destas decisões, parecem-me óbvias e decorrentes de formas de pensamento político e humano muito singulares.

9 comentários:

  1. Não sei se o Público refere o projeto "Palavra Chave", que existe em Portugal, em regime de voluntariado (um dos vencedores do Programa EDP Solidária 2013), ou o projeto "A poesia não tem grades", existente há vários anos. Em regime de voluntariado, com o apoio da Direção Geral da Reinserção e dos Serviços Prisionais. São projetos que usam os livros e a leitura para facilitar o processo de reintegração social dos reclusos. Em alguns casos, os voluntários são reclusos que apoiam os outros. Talvez uma eventual "redução de pena" ainda não esteja na forja, mas, por outro lado, evita-se a "mercantilização" da coisa (trocar leituras por dias de cadeia...).

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O Público não regista, realmente, nenhum dos 2 programas que refere. E eu confesso que só me recordava do segundo. Agradeço as suas achegas e concordo, em parte, com os seus pontos de vista, embora se não houver "troca" (livros por dias de pena, ou outras alternativas) o problema da sobrelotação irá manter-se.

      Eliminar
    2. Eu acho que, indiretamente, as penas acabam por ser reduzidas por "bom comportamento" (veja-se o caso do Dr. Isaltino Morais- ggg). Além disso, os poetas ou amantes da poesia tendem a ser magros, logo ocupam menos espaço nas exíguas celas (duplo gggg).

      Eliminar
    3. ...E não falou da exiguidade física de Oliveira Costa, tão airoso de corpo como o seu inventor e amigo de Belém...
      Quanto à elegância dos poetas, meu caro Artur Costa, não posso concordar consigo. Repare-se nas últimas fotografias de Herberto, na rotundidade burguesa de Castilho, para não falar nas redondezas líricas de Fernanda de Castro ou da Natália, esquecendo as senhoras poetas da nossa terra... Mas Sophia, para sermos justos, sempre foi magra e elegante - valha a verdade.

      Eliminar
  2. Não percebo como a compra de livros, selos, lápis e papel no interior das prisões pode «acelerar a [...] reabilitação» de um preso, ao invés de receberem os mesmos materiais de fora. Deve basear-se nalgum estudo profundo...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Estes apaniguados do "Cameirão" são um pouco à imagem do seu dono: curtos de horizontes e muito reduzidos de massa cinzenta...

      Eliminar
    2. Eu sei que somos mais inteligentes que "eles" (espero, APS, que me perdoe a impertinência), mas a coisa, sendo estúpida, tem uma explicação.
      Em primeiro lugar, há pressão da opinião pública para que se eliminem o que é considerado um excesso de boa vida para os presos.
      Em segundo lugar, não são apenas aqueles produtos que são proibidos. Alguns artigos de higiene, por exemplo, estão também incluídos na medida.
      A ideia também não se pode relacionar diretamente com "acelerar a reabilitação", mas com estimular o bom comportamento. Os presos recebem recompensas em dinheiro, ou "pontos", se cumprirem determinadas regras de comportamento, e com esse dinheiro podem adquirir os referidos produtos.
      No fundo, contribui tanto para a reabilitação como receber redução de pena por ler um livro ou por "praticar atividades culturais como a leitura". Trata-se apenas de receber benesses em troca de qualquer coisa, só que os conservadores ingleses não são tão chiques como os socialistas franceses.
      Perdoem-me o tom um pouco belicoso. Não é por mal.

      Eliminar
    3. O equilíbrio, penso, é sempre o mais difícil nestas decisões políticas que acabam por ser fracturantes (para usar um termo em voga).
      E uma boa parte destes problemas se põe por razões económicas, que são normalmente escamoteadas. Há quem diga que, para além da pressão dos fanáticos anti-tabaco, a proibição de fumar, nos aviões, se deveu mais ao excessivo custo da limpeza peródica dos filtros de ar...
      No caso das prisões, o problema é também os custos. Com o aumento da criminalidade a nível global, o orçamento dos ministérios da Justiça disparou. Daí a flexibilização dos códigos penais, com tendência para abrandar os tempos de detenção - muitas destas coisas têm vertentes e razões económicas. Até na Saúde.
      A notícia no "Obs." não era muito detalhada em relação à Grã-Bretanha, mas eu não deixo de achar estúpida e desumana a decisão de proibir, vindos do exterior, livros, selos...
      Taubira, até porque é mestiça e foi, na juventude, da extrema-esquerda, é muito contestada em França, mas, do meu ponto de vista, está a fazer um bom trabalho.
      Estes diálogos são sempre estimulantes, para mim..:-)
      Desejo-lhe uma boa noite!

      Eliminar
    4. Boa noite!
      (Tenho uma certa admiração por essa senhora, sobretudo pela coragem de se manter digna neste mundo de homens brancos).

      Eliminar