sábado, 1 de outubro de 2011

Osmose (23) : 4 estações


Pesa as palavras muito devagar, como se cada frase fosse crucial para a imortalidade ou, humildemente, para mais uns anos de vida, lúcida e inteira. O corpo quase imóvel, no sofá, ao fundo. Dir-se-ia que uma pele antiga o abandona, nas mãos ligeiramente esfaceladas. Uma pele rósea, que parece jovem, vem ocupando o espaço a descoberto. Como as cobras deixam, pelos trilhos da mata que acabamos de percorrer, as suas gazes inconsúteis e transparentes de Verão, que já de nada lhes servem, para se revestirem da melancolia do Outono. Faz um gesto brusco, com a mão esquerda, para anunciar o Inverno, e cala-se por momentos. Mas, pouco depois, apesar das manchas pelo corpo, das rugas e do cansaço, volta a falar da Primavera. Mas só o faz de memória, pese embora um brilho intenso nos seus olhos azúis.

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