terça-feira, 20 de outubro de 2015

Divagações 99


 Em louvor de uma infância

Hoje, tudo tem embalagens evasivas: em blister, tetrapack e quejandos. Aformoseadas até ao limite do disfarce ou dissimulação, onde os produtos jazem muito pouco substantivos, menos ainda se lhes descobre a filiação ou origem que permita às novas gerações conhecer-lhes a história em toda a sua simplicidade.
Quando criança, eu estava muito pouco acostumado à técnica, mas sabia, por exemplo, o que era um contador de água. E o seu verdete, quando já envelhecido. Desde cedo, sabia mudar fusíveis, ensinado que fora pela minha Mãe. Conhecia a cor do chumbo e do mercúrio. E os dejectos das cabras vicinais, como também os figos equestres que, por vezes, sinalizavam os animais de passagem pelos caminhos de terra batida, poeirentos. Sabia de como os ninhos eram feitos e conseguia facilmente distinguir um ovo de pata de outro, de galinha. Pasmava da galinha choca - ainda não havia os aviários -, na obscuridade da loja, sobre o enorme cesto vindimeiro, protegendo os pintaínhos recém-nascidos. Surpreendia-me com a agilidade das sardaniscas, fugindo por entre as pedras, nas manhãs de Sol. Tudo isto, apesar de viver numa cidade, embora de província, onde ainda não havia embalagens.

9 comentários:

  1. Eu vejo as coisas assim: as embalagens industriais são as grandes causadoras da miséria moral e do declínio da Humanidade.
    (Mas os calções ficam-lhe bem!)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Pois seja, que os Oceanos estão cheios delas...
      Muito obrigado pelo cumprimento!

      Eliminar
  2. E tb sabia mudar um fusível. Toda a gente tinha de saber mudar um fusível, senão podia ficar às escuras.

    ResponderEliminar
  3. O primeiro comentário que fiz não ficou publicado. :(
    Ora vamos lá tentar repeti-lo:
    Primeiro um :) à 2.ª parte do comentário de Artur Costa.
    Tb sou do tempo em que não havia embalagens: nem de leite, nem de farinha, nem de açúcar, bolachas, etc. Bem, havia de gelados, rebuçados, chocolates, etc.
    Mas não sabia qu chamavam figos aos dejetos equestres. :-))
    Bom dia!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O Google continua com muita embalagem, mas pouca eficiência.
      Quanto aos "figos cavalares", sempre achei a expressão muito sugestiva..:-)
      Bom dia!

      Eliminar
  4. É verdade, houve muito que se ganhou, mas também houve muito que se perdeu. E algumas coisas bem podiam voltar, nomeadamente as coisas sem tantas embalagens de plástico. Bom dia!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Há umas embalagens de plástico transparente para "croissants" (4 normalmente), nas grandes superfícies, que são um escândalo de tamanho e aspecto, por exemplo...
      Bom dia!

      Eliminar
  5. Eu também sabia mudar fusíveis! :)

    Há embalagens que eram perfeitamente dispensáveis e isso ajudaria bastante o planeta. Há um exagero na utilização de embalagens plásticas.

    A foto é gira!

    Boa noite:)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Pelos vistos, quanto aos fusíveis, não fui só eu que aprendi..:-)
      É realmente uma enormidade o lixo que fazemos e deitamos fora todos os dias. E, problema pior, o que os mais desleixados vão deitando para o chão, para as margens dos rios e para o Atlântico, numa sucessão irresponsável.
      Estas fotografias antigas têm quase sempre um tom pitoresco..:-)
      Boa noite!

      Eliminar