sexta-feira, 5 de junho de 2015

De uma entrevista já antiga


A entrevista de Clara Ferreira Alves a Michel Houellebecq foi publicada na revista do Expresso de 23 de Maio de 2015, e sendo já velha, não deixa de ser interessante. O pequeníssimo excerto, que deixo em imagem, não sendo propriamente uma pergunta, é uma reflexão de C. F. A., com certo grau de objectividade que me apraz aqui deixar, para memória futura.

11 comentários:

  1. Quando diz "um certo grau" de objetividade...
    A mim parece mais a superficialidade que alguns dos nossos "intelectuais" demonstram quando querem brilhar ou ser originais. O método consiste em tomar o todo pela parte, em generalizar uma ideia, e daí construir uma tese que pareça "provocadora" ou "diferente".
    O que significa ser detestado "no seu país"?
    Da forma como está, parece querer dizer-se que é ser detestado por uma maioria, por correntes dominantes de opinião, quiçá por todos. Porque detestado por apenas alguns, quem não o é? Tanto faz ser escritor como mecânico.
    Por alguns, são detestados bastantes escritores medíocres e amáveis. Por alguns, por muitos, por quase todos, são amados escritores que estão longe de ser medíocres ou amáveis.
    Por todos, não conheço ninguém.
    Claro que Saramago era detestado - mas não por todos. A bem dizer, ele também detestava os portugueses e Portugal. Goetzee saiu da África do Sul, mas era mesmo detestado por todos? Seria por muitos mas, como Saramago, não propriamente pela sua qualidade de "escritor", mas por outras razões - as suas opiniões políticas, o seu ativismo.
    Quanto a Amis, viveu efetivamente no Uruguai dois ou três anos, mas foi por razões pessoais - a experiência e o facto de ter casado com uma uruguaia. Voltou ao Reino Unido, onde reside, onde é professor universitário. Claro que, como cidadão global, especialmente do quadrante anglo-saxónico, passa algumas temporadas nos Estados Unidos. Mas será mesmo "detestado" na Inglaterra?

    Enfim, eu diria que aquele pequeno trecho de CFA pode ir diretamente para os painéis com frases de choque que costumam circular nas redes sociais. (Mas eu sou suspeito, e a senhora irrita-me, mais pela forma como diz do que pelo que diz).

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    1. Desagradam-me, e muito, as prestações televisivas de CFA, mas acho que ela escreve (muito?) bem e gosto muito de a ler: é arguta, expõe bem os assuntos e é frontal - coisa rara nos escriturários e publicitários lusos que são, quase todos, de águas mansas. É evidente que o meu "certo grau" admitia algum desconto subjectivo, meu, ao extremismo dogmático da reflexão, em si.
      Ainda hoje vêm no "Público" umas referências às rasuras (nas dedicatórias das edições originais de algumas obras) de Saramago, que ele fez, ao nome de Isabel da Nóbrega, sua companheira de mais de uma década. António Guerreiro explica, e bem.
      A diatribe, anterior, contra o nosso prémio Nobel, encaixa como o aicebergue: só 15% está fora de água. Não nos esqueçamos que só 10% (núcleo duro), dos portugueses, vota PC... E foi moda e de bom tom gostar dos livros de Saramago. Eu nunca fui um indefectível da sua obra, mas reconheço-lhe mérito como escritor, e respeito, como singulares e corajosas, muitas das suas intervenções cívicas, enquanto foi vivo.
      Finalmente, todos temos as nossas fraquezas: aquela frase final de CFA, "Só os medíocres são amados por todos", lembrou-me e assenta como uma luva à lesma do Mãezinha...
      Um bom fim-de-semana!

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    2. Começo a creditar que o Válter está destinado ao Nobel. Afinal, conheço mais portugueses que o detestam do que os que gostam dele. Aplicando a teoria desta dona Clara Pacheco Pereira Alves...

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  2. Não me parece que Saramago fosse detestado em Portugal, muito pelo contrário. O que o levou a sair do país foi aquela censura de um idiota chamado Sousa Lara que, por acaso, era secretário de Estado da Cultura.
    Também acho que Coetzee saiu da África do Sul por questões políticas. Devia ser difícil (con)viver no apartheid.
    Quanto a Martin Amis, não sei.
    E Houellebecq: não sou francesa e acho-o um personagem detestável. E tb não gosto da escrita dele.

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    1. Como nos suicídios, as razões para emigrações, creio, são sempre múltiplas, MR. Por vezes, também políticas. Penso que muitos dos que detestam (ainda) Saramago, é por ele ter sido comunista confesso e assumido, muito embora ele tivesse, algumas discordâncias públicas assumidas, com a ortodoxia do Partido. Quanto ao Sousa L., coitado... ficará célebre (se ficar em rodapé) por causa de Saramago.
      Creio que a saída de Coetzee é mais complexa. Mas é, para mim, um grande escritor.
      Um bom resto de dia!

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  3. Acho piada a esse seu "odiozito" de estimação, chamemos-lhe assim, pelo VHM.
    Também acho o escritor embirrante.
    Boa noite:)

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    1. O homenzito até parece de gelatina, ainda para mais com aquela cabeça de ovo, que estar cheia de clara, com pouca gema...Agora, que ela mama muito doce, mama e sabe despertar o instinto maternal nas mulheres, suas fãs principais. Mas do ponto de vista literário é um embuste.
      Por outro lado e, quanto a mim, como diz o povo:"Ódio velho, não cansa".
      Boa noite e bom fim-de-semana!

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  4. Errata:
    onde escrevi "que estar cheia", deveria ter escrito - que deve estar cheia.

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  5. Boa tarde,

    Talvez aconteça com alguns escritores o que acontece à generalidade das pessoas, quem vive diariamente com elas, e por isso as conhecem melhor, podem não gostar delas porque conhecem os seus defeitos, que com o passar do tempo, nessa convivência diária, de baixo do mesmo teto (país) podem acabar por as detestar. Mas quem só as vê ou lida com elas muito esporadicamente, ou seja, não tem que viver com elas na mesma casa, tende a não dar muita importância aos defeitos, a ignora-los, e a só considerar as virtudes, as qualidades ou capacidades, sejam profissionais ou culturais. Por exemplo, Saramago (que eu li no tempo da escola) foi com certeza um grande escritor, mas era comunista, por isso a maioria das pessoas, no seu país, não gostava dele, porque alguém que é comunista, seja em que parte do mundo for, é no mínimo hipócrita, porque os comunistas nunca admitiram nem admitem as atrocidades que foram feitas em nome do comunismo no passado nem no presente, apenas sabem falar do que os outros fizeram de mal. E diga-se de passagem, por exemplo o que os nazis fizeram, comparado com o que os comunistas na China e na Rússia fizeram, foram uns anjinhos comparados com eles. Por isso, poucos gostam de Saramago, por isso mesmo, por ser comunista e logo um hipócrita. Claro que existe aquela percentagem de 10% do eleitorado que é comunista ou de extrema esquerda que gosta dele. Mas os outros 90% de pessoas não se deixam enganar por essas coisas do comunismo.

    Cumprimentos, João Silva

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    1. Incorporar, à obra, as opções políticas ou morais dos artistas, é sempre redutor, embora, muitas vezes, seja difícil, não o fazer. L.-F. Céline é talvez o caso mais dilemático e exemplar da modernidade recente.
      Ou se lê com preocupações éticas ou se lê, apenas, com o ponto de vista dos requisitos e rigor da qualidade literária das obras, omitindo a conduta humana dos autores. Eu, pessoalmente, prefiro esta opção.
      Saudações!

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