domingo, 5 de abril de 2015

A par e passo 131


Não será aqui o lugar mais próprio para abordar completamente o processo ortográfico (francês). O absurdo da nossa ortografia que é, na verdade, uma das fabricações mais ridículas do mundo, é bem conhecido. Ela é uma recolha imperiosa ou imperativa de uma quantidade de erros de etimologia artificialmente fixados por razões inexplicáveis. Deixemos o processo de lado, (não sem sublinhar até que ponto a complicação ortográfica da nossa língua a coloca numa posição de inferioridade, em relação a algumas outras. O italiano é perfeitamente fonético, enquanto o francês possui duas formas de escrever f, quatro de escrever k, duas de escrever z, etc.)

Paul Valéry, in Variété III (pg. 279/80).

Duas breves notas:
1. Não leve esta citação, meu caro Artur Costa, como uma picardia minha, ou tomada de posição em relação ao novo AO, de que é um intransigente defensor. Este poste é uma mera sequência, natural, dos anteriores, que tenho vindo a traduzir.
2. Olhando para as lombadas dos dicionários que uso, apercebi-me da aparente maior riqueza do vocabulário português, em relação ao da língua francesa. Enquanto o dicionário de Português-Francês tem  752 páginas, o de Francês-Português tem, apenas, 628.

2 comentários:

  1. Ora essa, ora essa. Fico contente por saber que este grande intelectual, que citei há dias poucos dias no Linguado, via como superior uma ortografia fonética... A ortografia é a componente mais simples, e mais irrelevante, da escrita. Porque há de ser complicada e incoerente? Que ortografia pode resultar das dezenas de raízes e influências que uma língua moderna integra? Uma ortografia que respeite todas as etimologias legítimas será possível? Porque queremos impor o latim como normal, quando o grego, o árabe, algumas línguas germânicas, e mesmo o francês e o inglês, enriqueceram o nosso vocabulário?

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    1. A minha posição é lateral, como creio que sabe, até porque, um pouco por comodismo, uso e mantenho a antiga ortografia. Mesmo que ainda trabalhasse, e como nunca trabalhei para o Estado, provavelmente poderia manter essa liberdade e opção.
      Mas, por outro lado, resulta também da minha observação dos pragmáticos ingleses, como exemplo, que nunca sentiram necessidade de uniformizar a grafia da língua, sendo ela falada em muito mais países (e com muitos mais falantes) do que a portuguesa.
      Dito isto, com ou sem AO, eu creio que continuaremos a perceber bem o "brasileiro" falado, embora os brasileiros (alguns, e não poucos - tenho experiência disso...) continuem, por vezes, a ter dificuldade em entender o "português", falado, também.

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