A placa acima reproduzida indica a entrada na aldeia de Guttenberg, com cerca de 600 habitantes, num dos estados federados da Alemanha que os antigos súbditos do Rei da Baviera designam, ainda hoje, como "Estado Livre da Baviera". Avisam-se todos os incautos que a saudação normal, em território alemão, é o "Guten Tag", correspondente ao nosso "Bom dia", puro e simples. No entanto, essa saudação geral provoca, ao entrar no Estado Livre da Baviera, uma incompreensivel reacção de desconfiança quase ancestral ao forasteiro. Substituir o "Grüss Gott" por "Guten Tag" significa a intrusão de um estranho, tanto estrangeiro como, sobretudo, prussiano.
Não fosse a recente demissão do Ministro da Defesa, Freiherr Karl-Theodor zu Guttenberg, o lugarejo, certamente, não daria azo a uma notícia do DIE ZEIT. Sucede, no entanto, que o lugar de residência física e de alma (=Ka-Tes Heimat) do demitido ministro se tornou num lugar de peregrinação, com forasteiros a espreitar pelos portões fechados dos seus aposentos que a seguir se reproduzem.
Remeto para a leitura integral do artigo do DIE ZEIT pelo facto de o considerar como uma pérola jornalística, aliando a observação objectiva a uma fina ironia sobre provincianismos vários, tanto ancestrais como actuais, a que não conseguimos resistir para fazer o presente "post". No lugarejo de Guttenberg, os habitantes falam do barão como um dos seus, o "seu Ka-Te" (=Karl-Theodor...) que vive na sua bela mansão, com a sua bela consorte (descendente de Bismarck) e duas filhas que, como ele próprio invocou num dos seus últimos discursos de defesa, sofreram muito com o tempo que dedicara à investigação para a sua tese de doutoramento em detrimento do apoio familiar (!). "Ka-Te" passeia o seu cão pelas ruas do lugarejo. Ainda ao serviço da nação levantava, por vezes, voo num helicóptero a partir dos campos próximos e, de acordo com as imagens constantes da sua página na internet, gostava de se apresentar com o fardamento dos ramos das forças armadas. - Há lusitos que também gostaram dessa benesse para apurar o seu sentido estético e de imagem - Quer isto dizer que a foto do Ministro, acompanhada da sua consorte, ao desembarcarem, no Afeganistão, vestidos de calças brancas e com ar de recreio, terá sido um "erro de casting".
Os aldeões entrevistados no artigo do DIE ZEIT pertencem, certamente, a essa "maioria" que as sondagens procuram para atestar a popularidade do recém-demitido Ministro. Eles falam do "seu Ka-Te" - num misto de ervilhaca, i.e., parolice, subserviência e, quiçá, disfarçada inveja pelo diferente estatuto económico e social. Até fazem questão de sublinhar que a própria chanceler Angela Merkel disse que "não empregou um investigador, mas um ministro" (palavras de sabedoria e os sublinhados são nossos). O que une, profundamente, os habitantes do lugar ao seu barão é a sua crença católica, apostólica romana, facto que os impede de falar do amigo de peito do Freiherr zu Guttenberg, i.e., um empresário do ramo da produção/comercialização de artigos eróticos. Parafraseando um dito do Dr. Rebelo de Sousa: "... com amigos destes ..." concluímos o relato sobre os habitantes do lugarejo.
Ora todo este caldinho daria um belo "script" para uma novela, tanto de mau gosto nacional como europeu, em que o "povinho" se poderia deliciar - numa postura de identificação/projecção - com mundos acima da sua realidade tristonha, confundindo o espectáculo com a política.
Valha a verdade que o lugarejo de Guttenberg já fora, em tempos, território dos reformadores de Lutero. Em tempos não muito distantes, um distinto familiar, Karl-Ludwig zu Guttenberg, participou na revolta conhecida pelo "círculo de oposição a Hitler de 20 de Julho de 1944", tendo sido executado pouco antes do fim da guerra, entre 23./24.4.1945. Convém, igualmente, recordar que a Constituição de 1949 confirmou a disposição de 1919 no sentido da abolição dos títulos nobiliárquicos, integrando, somente, o próprio apelido do cidadão.
A seriedade, a ética, entre outros, obrigam os esclarecidos a não embarcar em certos embustes, sobretudo aqueles que, como eu, aprenderam, no pós-guerra, o sentido último dos imperativos de Fichte e Kant.
Remeto para a leitura integral do artigo do DIE ZEIT pelo facto de o considerar como uma pérola jornalística, aliando a observação objectiva a uma fina ironia sobre provincianismos vários, tanto ancestrais como actuais, a que não conseguimos resistir para fazer o presente "post". No lugarejo de Guttenberg, os habitantes falam do barão como um dos seus, o "seu Ka-Te" (=Karl-Theodor...) que vive na sua bela mansão, com a sua bela consorte (descendente de Bismarck) e duas filhas que, como ele próprio invocou num dos seus últimos discursos de defesa, sofreram muito com o tempo que dedicara à investigação para a sua tese de doutoramento em detrimento do apoio familiar (!). "Ka-Te" passeia o seu cão pelas ruas do lugarejo. Ainda ao serviço da nação levantava, por vezes, voo num helicóptero a partir dos campos próximos e, de acordo com as imagens constantes da sua página na internet, gostava de se apresentar com o fardamento dos ramos das forças armadas. - Há lusitos que também gostaram dessa benesse para apurar o seu sentido estético e de imagem - Quer isto dizer que a foto do Ministro, acompanhada da sua consorte, ao desembarcarem, no Afeganistão, vestidos de calças brancas e com ar de recreio, terá sido um "erro de casting".
Os aldeões entrevistados no artigo do DIE ZEIT pertencem, certamente, a essa "maioria" que as sondagens procuram para atestar a popularidade do recém-demitido Ministro. Eles falam do "seu Ka-Te" - num misto de ervilhaca, i.e., parolice, subserviência e, quiçá, disfarçada inveja pelo diferente estatuto económico e social. Até fazem questão de sublinhar que a própria chanceler Angela Merkel disse que "não empregou um investigador, mas um ministro" (palavras de sabedoria e os sublinhados são nossos). O que une, profundamente, os habitantes do lugar ao seu barão é a sua crença católica, apostólica romana, facto que os impede de falar do amigo de peito do Freiherr zu Guttenberg, i.e., um empresário do ramo da produção/comercialização de artigos eróticos. Parafraseando um dito do Dr. Rebelo de Sousa: "... com amigos destes ..." concluímos o relato sobre os habitantes do lugarejo.
Ora todo este caldinho daria um belo "script" para uma novela, tanto de mau gosto nacional como europeu, em que o "povinho" se poderia deliciar - numa postura de identificação/projecção - com mundos acima da sua realidade tristonha, confundindo o espectáculo com a política.
Valha a verdade que o lugarejo de Guttenberg já fora, em tempos, território dos reformadores de Lutero. Em tempos não muito distantes, um distinto familiar, Karl-Ludwig zu Guttenberg, participou na revolta conhecida pelo "círculo de oposição a Hitler de 20 de Julho de 1944", tendo sido executado pouco antes do fim da guerra, entre 23./24.4.1945. Convém, igualmente, recordar que a Constituição de 1949 confirmou a disposição de 1919 no sentido da abolição dos títulos nobiliárquicos, integrando, somente, o próprio apelido do cidadão.
A seriedade, a ética, entre outros, obrigam os esclarecidos a não embarcar em certos embustes, sobretudo aqueles que, como eu, aprenderam, no pós-guerra, o sentido último dos imperativos de Fichte e Kant.
Post de HMJ dedicado a todos os meus amigos portugueses e alemães
Só agora é que li e gostei imenso.
ResponderEliminarE quanto a títulos... lá como cá. E cá como lá.
Obrigada MR, foi um dever cívico.
ResponderEliminarParabéns, HMJ, por este post.
ResponderEliminarA Baviera e a sua vizinha Salzburgo...
Para Miss Tolstoi,
ResponderEliminaragradeço a sua leitura atenta e o seu comentário.
Finíssima ironia! :-) Também gostei muito
ResponderEliminarPara c.a.
ResponderEliminarobrigada pelo comentário.