quarta-feira, 9 de março de 2011

Coincidências Leirienses - Rodrigues Lobo


Tinha eu lido, há pouco tempo, um opúsculo de Carlos Alberto Ferreira, sobre Francisco Rodrigues Lobo ("Fontes inéditas para o estudo da sua vida e obra", Biblos, 1943), quando ao passar, hoje, pelo blogue "Memórias e Imagens", de Margarida Elias, - aonde vou refrescar, diariamente, a vista -, me deparei com uns versos do poeta leiriense e umas bonitas fotografias da sua terra natal. Ora, eu acho que nunca falei dele aqui, no Arpose, e talvez já seja tempo.
Este cristão-novo que nasceu na terra do Lis, por volta de 1579, veio a morrer num naufrágio nas águas do Tejo, em 1622. Um homem entre 2 rios, portanto. Parece que era "fresco", o escritor leiriense, por algumas cartas que deixou, e foram escritas a umas comediantes de Lisboa. Uma das quais endereçada a Maria Tardia, que era amiga de outra dama, Josefa Vaca, de nome, e talvez de má fama. A carta, que repousa na Biblioteca da Ajuda (Ms. 50-I-66, fl. 28), é pouco cavalheirosa, mas merece que aqui deixe uns excertos, para amostra. Aí vai em linguagem, tanto quanto possivel, actualizada, o início da missiva de Rodrigues Lobo:

"Pelas grandes obrigações em que a V. M. lhe estão afeiçoados ao género feminino, tenho eu algumas de procurar seu gosto, crédito, e interesse, que como meu principal foi sempre contentar a Damas devo muito às que se contentam de satisfazer a seus servidores com a liberalidade com que V. M. os trata, desmentindo na praça com quem paga o que a seu nome deve; e porque dos dois polos dessa Companhia é V. M. tida por Zona tórrida nesta terra, desejando temperar o clima da Sra. Josefa Vaca com o de V. M. a ela fiz advertências, e a V. M. faço lembranças, que não perca por carta de mais, o que ela deixa de ganhar por ela ter de menos; que se pode ser na catimplora de sua esquivança, se esfriara a facilidade de V. M., e no fogo dessa luxúria se aquentara a sua aspereza, andarão ambas temperadas como Relógios, e como tais não tiveram hora perdida aproveitando-se do tempo e da idade, que deixará, cedo na espinha a confiança, por mais que a opinião queira imortalizar sua gentileza. Nos autos de devassa que aqui se tirarão dos ferimentos e homicídios que V. Ms. cometeram nesta Cidade depois de sua vinda há culpas de V. M. a respeito de que cai depressa, e se ergue devagar. obriga a mto. uma nega nada, tem rosto de dama, acenos de freira, corpo de cigana, meneios de p[...] e trato de mercador, parece bem, e não baila mal, fala com encosto, olha com luxúria, e bole como agulha de marear com todo o corpo, a qualquer palavra que diz, como se nadara em seco. das quais conjecturas a poucos lanços de Astrologia se alcança ser V. M. muito mais quente que tardia, e tão excelente na arte secreta que usa, que até no que representa manifesta sua suficiência..."

Sem comentários:

Enviar um comentário