quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Salão de Recusados XXVI : rigor e geometria


As Coordenadas Líricas

Desviou-se o paralelo um quase nada
e tudo escureceu:
era luz disfarçada em madrugada
a luz que me envolveu.

A geométrica forma dos meus passos
procura um mar redondo.
Levo comigo, dentro dos meus braços,
oculto, todo o mundo.

Sozinha já não vou. Apenas fujo
às negras emboscadas.
Em cada esfera desenho o meu refúgio
- as minhas coordenadas.

Fernanda Botelho (1926-2007)



A solidão é essa morte imensa
onde os mortos não cessam de viver.
E onde os vivos recolhem a tristeza
de irem morrendo sem saber a quê,
embora se perturbem. E apareça
o grande nascimento ao que já se é.

Fernando Echevarría (1929)


VI

Deixo este recado para Karl:
todo o rigor da ruptura
cria os possíveis da fala

mas por detrás das palavras
há uma prática
crepuscular

o modo de produção da noite
é literário

Vasco da Graça Moura (1942)

2 comentários:

  1. Gosto bastante dos romances de Fernanda Botelho; Não me lembro de ter lido poesia dela. Gostei. Obrigada!

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  2. Tenho de confessar que li, com alguma dificuldade, parte da obra romanesca de F.B..
    Mas também devo dizer que tenho uma dívida de gratidão para com ela.
    Por outro lado há alguns poemas dela muito interessantes.

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