sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Favoritos XXXVI : Abílio Manuel...



...Guerra Junqueiro, nascido a 17 de Setembro de 1850, foi, há muito tempo, com António Nobre, o meu primeiro (ex-aequo) poeta favorito. O único livro de Poesia da biblioteca (pequeníssima) de meu Pai era "Os Simples", 9ª edição, de 1924. Foi o nosso Victor Hugo, que até no funeral teve um acompanhamento numerosíssimo de gente anónima e de povo. Hoje, com alguma dificuldade, ainda lhe encontro alguns versos de um lirismo quase naif, tocante na sua simplicidade ingénua e, provavelmente, genuína:

...E a dos olhos garços pastorinha bela
Fia no seu fuso linho por corar;
É trigueiro o linho, trigueirinha é ela...
Rodopia o fuso...quando for donzela,
Já terá camisas para se ir casar!...

E esse fuso alegre onde se enrosca o linho
Já foi ramo verde n'esse tronco em brasas;
Deu já cachos brancos como o branco arminho,
Já sobre ele a ave construiu seu ninho,
Já sobre ele amando palpitaram asas!...

Fuso, como giras em dedinhos breves
Prasenteiramente, com tão louco ardor!
Que estarás fiando?...que enxovais?...que neves?...
Se serão camisas, ou mortalhas leves,
Cama para bodas, ou lençóis de dor!...


P.S.: para MR que, se bem me lembro, de quando em vez relê Junqueiro.

2 comentários:

  1. Yes! Obrigada!
    E também gosto de reler alguns textos dele, como a «Defesa perante o tribunal», em 1907: «Acusam-me de injúrias ao rei de Portugal. Porquê? Porque chamei à sua relaeza uma tirania de engorda e de vista baixa. / Injuriar é caluniar. Sendo incapaz de calúnias, sou incapaz de injúrias. [...] A frase é indecorosa? jamais. As palavras são indecorosas, quando há mentira nas palavras. [...]»

    E releio muitas vezes «O Caçador Simão»:

    «Jaz el-rei entrevado e moribundo
    Na fortaleza lôbrega e silente...
    Corta a mudez sinistra o mar profundo...
    Chora a rainha desgrenhadamente...

    Papagaio real, diz-me, quem passa?
    – É o príncipe Simão que vai à caça.

    Os sinos dobram pelo rei finado...
    Morte tremenda, pavoroso horror!...
    Sai das almas atónitas um brado,
    Um brado imenso d'amargura e dor...

    Papagaio real, diz-me, quem passa?
    – É o príncipe Simão que vai à caça.

    Cospe o estrangeiro afrontas assassinas
    Sobre o rosto da Pátria a agonizar...
    Rugem nos corações fúrias leoninas,
    Erguem-se as mãos crispadas para o ar!...

    Papagaio real, diz-me, quem passa?
    – É o príncipe Simão que vai à caça.

    A Pátria é morta! a Liberdade é morta!
    Noite negra sem astros, sem faróis!
    Ri o estrangeiro odioso à nossa porta,
    Guarda a Infâmia os sepulcros dos Heróis!

    Papagaio real, diz-me, quem passa?
    – É o príncipe Simão que vai à caça.

    Tiros ao longe numa luta acesa!
    Rola indomitamente a multidão...
    Tocam clarins de guerra a Marselhesa...
    Desaba um trono em súbita explosão!...

    Papagaio real, diz-me, quem passa?
    – É alguém, é alguém que foi à caça.

    Do caçador Simão!...»

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  2. Não conhecia a "Defesa..." de G.F. (tenho muito a aprender consigo, sobretudo em prosa, cartazes e República...), de que lhe agradeço a pista, MR.
    E o anexo d'"O Caçador Simão" que, embora conhecesse,é bem interessante.

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