Posso dizer, felizmente, que, na minha infância e adolescência, houve espaço para o lazer. O que, na verdade, significava também liberdade. E autonomia e responsabilidade para o uso desse ócio. De perder tempo, mas também de imaginar e pensar, de preencher a meu modo os espaços (aparentemente) vazios. De brincar, de acertar contas e inventariar acções, sem grandes nem rigorosos pragmatismos.
Creio que, a partir dos anos 80 do século passado, começámos a assistir à ocupação total dos tempos livres e dos espaços, com os pais, frenéticos, a inscrever, sistematicamente, os filhos em aulas de judo, de línguas, de natação, de música ou ballet... No tempo sobrante, as criancinhas derramavam-se num sofá, estafadas e quietas, frente ao televisor. E, julgo, que começaram a crescer e amadurecer muito mais devagar.
Suspeito, embora possa estar a ser injusto, que alguns pais procuravam que os filhos os não incomodassem demasiado. Mas, mesmo que de boa-fé, perdeu-se muito desse diálogo intergeracional que contribuía, mesmo que não fosse seguido, de imediato, pelos mais novos, perdeu-se - repito - essa transmissão de experiência, fundamental para o amadurecimento e compreensão da vida.
Pode haver hoje, realmente, mais competência tecnológica e mais destreza física nos infantes. Mas a alforria chega mais tarde e a infantilização - parece-me - vai mais longe.
Concordo inteiramente. Vivi a minha infância nos anos setenta, com muita liberdade para brincar na rua com as crianças vizinhas, e também com muito contacto com os mais velhos, com os quais aprendi imenso. Considero-me uma felizarda, por isso. E, parece-me que foi a "'última leva" que viveu a infância assim. Partilho, por isso, da sua opinião relativamente aqueles que já viveram a infância nos anos 80. E que isso os infantilizou. Muitas vezes, noto certos comportamentos nos actuais trintões que associo muito aos adolescentes: a busca da aprovação permanente, uma certa falta de limites nas questões que colocam ainda mal conheceram os interlocutores, uma obsessão por tecnologias e por tudo o que é novo, um forte individualismo e uma forte uniformização de pensamento. Claro que há excepções, e a minha experiência vale o que vale, mas é o que noto.
ResponderEliminarContinuação de bom fim-de-semana. :-)
É bom saber que não sou o único a pensar assim.
EliminarAs brincadeiras de rua (tão memoráveis), pelo menos nas grandes cidades, acabaram. E os horizontes cerraram-se em pequenos espaços que vão do olhar ao écran ou telemóvel.
Incomoda-me sobretudo o dogmatismo sobranceiro (muitas vezes, indício de fragilidades várias) de algumas gerações, onde nunca se instala a dúvida metódica e saudável de poder pensar que o outro pode ter razão. Sinal de tempos autocráticos e mentes excessivamente especializadas, mas pouco abertas ao mundo real.
Um bom domingo, para si.
Concordo!
ResponderEliminarHoje as crianças quando deviam ter espaço para poder brincar e inventar livremente, passam demasiadas horas na escola e têm demasiadas disciplinas (falo do 1ºciclo - escola primária).
Boa noite!
Não estou muito a par dos programas, mas é bem possível que sejam excessivos, como a Isabel refere. Mas também acho que do pouco tempo livre se tira pouco, ou nenhum partido lúdico.
EliminarBoa noite!
Acho que cada geração é diferente e marca o seu tempo da maneira que acha mais criativa. Muitas coisas mudaram, as mulheres trabalham desde cedo, gostam muito dos seus filhos e querem vê-los livres da obesidade e dos péssimos programas da TV. Nas escolas o ensino não é activo nem interessante, culpa das máquinas pesadas e programas do Ministério da Educação.
ResponderEliminarSomos um grão de areia face a tanta coisa que desejava-mos melhorar. Mas não podemos ficar a comparar gerações. Há tanta coisa positiva, orgulho-me dos meus netos e filhos. Orgulho-me da democratização do ensino, dos idosos terem reformas e serem apoiados em termos de saúde e da qualidade de vida de tantas pessoas que lutaram por ela. Na minha visão o futuro vai ter um final feliz. Eu dei o meu pequeníssimo contributo e vou-me desligando com serenidade da vida, com um sorriso de alegria. A saúde também depende de nós e dos nossos pensamentos, tudo está certo e serve a nossa sabedoria. Prefiro olhar para a luz.
Uma moeda tem sempre duas faces, um facto pode sempre ser visto sob ângulos diversos e perspectivas.
EliminarMas gostaria de lembrar-lhe, por exemplo, que nunca houve tantas crianças obesas no mundo (dito civilizado), nunca, como hoje, o ambiente foi tão mal tratado (apesar dos programas das escolas, para as crianças, sobre o tema), o abismo entre pobres e ricos cresceu, progressiva e cruelmente, nestas duas últimas décadas.
É por isto e por muitas outras coisas - que não refiro - que não posso ter uma visão idílica do presente. Nem do futuro.
Peço desculpa de interferir neste último diálogo, mas a mim, que sou optimista, parece-me que estamos a regredir, precisamente porque houve nas últimas décadas uma abertura, um facilitismo e uma desresponsabilização, que formou pessoas pouco preparadas para enfrentar dificuldades e até, muito egoístas. (muitos dos que hoje nos governam vêm daí)
ResponderEliminarSe virmos bem, a democratização do ensino, foi uma coisa boa, mas trouxe também o facilitismo que se conhece, as reformas dos idosos, foi uma boa medida, mas será que vai continuar? Nós (eu, que já me reformaria no próximo ano e que vou ter que trabalhar até nem sei quando) vamos ter alguma reforma? A saúde está pelas ruas da amargura...as desigualdades sociais acentuam-se a olhos vistos, os jovens estão sem futuro...(também me orgulho dos meus sobrinhos, que tiraram os seus cursos direitinhos, com responsabilidade e que agora se vêem com trabalhos precários, ou sem trabalho)
Por muito optimista que se seja, não podemos fechar os olhos à realidade. Alguma coisa vai ter que mudar, mas vai ser a que preço?
Enfim, oxalá esteja enganada...
Bom domingo!
Pela minha parte, Isabel, não posso deixar de agradecer a sua intervenção e contributo, que sei ser sincero, real e fundamentado na sua própria experiência profissional e familiar.
ResponderEliminarO facto de eu ver as situações negativas, não me condena ao pessimismo, embora o meu optimismo pela Vida (humana) se tenha abalado bastante, e diminuído, nos últimos tempos.
Votos, também, de um bom domingo, para si.
Concordo com o que diz, mas tb temos de ver que 'no nosso tempo', a maioria das mulheres não trabalhava e estava em casa para receber os filhos quando chegavam da escola ou, mas pequenos, iam pô-los e buscá-los à escola.
ResponderEliminarAcho que muito dessas inscrições frenéticas em aulas de desporto, etc, tem a ver com a impossibilidade dos pais estarem em casa quando os filhos saem da escola.
Por outro lado, hoje é um perigo um miúdo brincar na rua e, em Lisboa, os miúdos da área de residência quase que não se conhecem porque andam em escolas diferentes e não podem brincar juntos na rua.
De qualquer modo, parece-me que os atuais pais se preocupam mais em sair com os filhos do que acontecia quando a minha filha era miúda. Muitos miúdos passavam os fins de semana em casa, quase que não saíam.E talvez po terem passado por essa experiência parece-me que hoje passeiem mais com os filhos.
Tomei boa nota, MR, das questões que levanta e dos exemplos que refere. Concordo que, em boa parte, há causas na vida dos nossos dias que prejudicam muito o conv´vio desejável pais/filhos. Bem como a inexistência de contactos humanos na mesma rua, no próprio prédio que habitamos...
EliminarMas também há muitas situações que observo, quase todos os dias, que não têm desculpa, nem justificação plausível.
Está cientificamente comprovado que o optimismo e a auto-eficácia melhoram a nossa saúde física, mental, social. Precisamos de saúde para ir trabalhando os equilíbrios necessários que ainda estão ao nosso alcance. O pessimismo só pode piorar tudo.
ResponderEliminarVivemos hoje a uma escala global por isso acho muito bem que os jovens adquiram experiências à dimensão global. Os nossos filhos terão que ser mais argutos a perceber as novas oportunidades de mercado, globais, e tornarem-se mais empreendedores. Para ter sucesso hoje é absolutamente necessário ser criativo. Compete aos professores e pais fomentarem um ensino para jovens criadores e não repetidores. O sucesso dos jovens depende muito do auto-conhecimento das suas potencialidades e da autoconfiança com que forem educados. Alguém me disse um dia: é necessário aceitar e transformar.
Através de alguns pontos (alheios) de comentários, parece-me ter havido um desvio ou deriva em relação à intenção inicial do meu poste.
EliminarCentrando a questão, importou-me destacar: 1) a dicotomia lazer/ ou excessivo tempo ocupado, nas crianças; 2) pouco diálogo intergeracional, no presente e passado recente; 3) maturidade mais tardia das últimas gerações.
Dito isto, penso que o optimismo não é um estado de espírito que se possa adoptar, como quem veste um casaco. Mas ele decorre, sempre, bem como o pessimismo, de uma avaliação, o mais possível objectiva, que se possa fazer da realidade que nos rodeia.
APS,
EliminarMas eu estou de acordo com o essencial do que diz, principalmente com o prantarem as crianças frente à tv.
Muitas, realmente, depois de um dia de "trabalho", só lhes resta atirar a toalha para o chão, quando chegam a casa, como nos combates de boxe..:-))
EliminarDesejo-lhe uma boa semana.
ResponderEliminarComo percebo pouco deste «Responder», respondi no sítio errado. :)
ResponderEliminarNão há problema! Eu entendi..:-)
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