O rapaz deitava-se na relva muito verde do coradouro, ainda húmida do orvalho matinal, e pacientemente esperava. Ia vendo, a pequena distância, formigas em carreiro, bichos-de -conta que se encaracolavam quando lhes tocava, e outros pequenos animais rastejantes de que nem sabia o nome, sinuosos por entre as hastes pequenas das ervas.
Tinha armado as duas ratoeiras, depois de alisar a relva em volta, na fronteira do coradouro, pouco antes de começar a horta, onde as couves já despontavam de espigos. Quando um pardal se aproximava, o coração dava saltos, inquieto, mas raramente os pássaros debicavam o pequeno pedaço de miolo de pão que fazia de isco, na armadilha. Mas, ao rapaz, bastava-lhe essa emoção infantil da caça.
Sozinho perante o mundo, levantava-se, manhã já alta, recolhia as ratoeiras, sacudia da camisola as pequenas gotas de água, que luziam ao sol, e regressava, contente, para casa.
Muitos anos passados (Maio de 1986), e com experiências múltiplas acumuladas, havia de escrever um poema sucinto e breve, que intitulou Lição de Ser:
Não há paixão nenhuma que se aprenda
amor que nos distraia ou verde
que não venha de infância
ofendido ao longe pelo som dos passos.
Todos os miúdos (e não só) gostam de ver os carreiros de formigas, tocar nos bichos-de conta...
ResponderEliminarUm bela evocação.
Muito obrigado,MR.
ResponderEliminar