quarta-feira, 27 de maio de 2015

Mais um poema, traduzido, de Tomas Tranströmer


Aos amigos, para lá de uma fronteira


I
Acabei por escrever-vos uma carta tão seca. Mas tudo aquilo que não pude dizer
foi enfunando e assim pleno, como outrora os dirigíveis
pode, finalmente, partir pelo céu durante a noite.

II
A minha carta está agora nas mãos do censor. Ele acende a sua lâmpada.
Nesse súbito clarão, as minhas frases evoluem como pequenos símios por entre grades de metal
que eles vão abanando, fazendo momices e arreganhando os dentes.

III
Terão de ler por entre as linhas. Havemos de nos ver dentro de duzentos anos,
quando os microfones estiverem esquecidos por dentro das paredes dos hotéis,
e quando puderem, por fim, adormecer, como se se transformassem em eternas trilobites.


Tomas Tranströmer (1931-2015), in Stigar (1973).

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