O sossego de terra deserta faz daquela ponta de areal o paraíso das aves marinhas, que no tempo primaveril vêm brincar para as praias abandonadas, principalmente do lado do rio, e ali chapinham na água, correm à desfilada pela areia dura da baixa-mar, ou aprazidamente se catam ao sol, gozando a tranquilidade dos entardeceres tão lúcidos e silenciosos. Os maçaricos andam aos bandos, correm num passinho lépido, levantam em voos súbitos; as gaivotas pairam alto, ou poisam à beira das ondas, paradas e soturnas; mas entre a bicheza que por aqui abunda, a mais cativante é decerto a garça, de uma alvura estreme, compassada e mesureira no seu andar de bicho pernalta, quedando-se às vezes estática, a remirar-se, a presumida, no espelho de alguma poça. Parece um reino encantado. O mar, o céu e a praia, o fresco hálito salino que de tudo transpira e a espaços se alterna com o respirar resinoso das matas próximas, sobretudo o sossego e isolamento, tão apetecido destas aves, suspicazes em seus modos, ao mesmo passo que serenas, tudo imprime ao lugar um sabor edénico - surpreendente e aprazível cantinho de um mundo de sonho.
Manuel Mendes (1906-1969), in A Sul do Tejo (pgs. 55/6).
A fotografia está fabulosa!
ResponderEliminarSe é do APS ou da HMJ, parabéns!
Boa noite:)
A César o que é de César: a foto, julgo ser de 2006, e foi tirada, creio, por Maria Júlia Laginha. Raptei-a da net...
EliminarBoa noite!
Gostei muito do texto. Que boa leitura logo pela manhã.
ResponderEliminarBom dia!
Estamos de acordo quanto à bela prosa...Pena que o autor esteja muito esquecido.
EliminarBom dia!