sábado, 30 de janeiro de 2016

Divagações 107


Tem vindo o Google, muito recentemente, a propor sob o seu logotipo figuras e acontecimentos, dia após dia, à memória e à devoção dos seus utilizadores. Nesse seu tique, muito regionalista e provinciano, de que o que é bom para a América, é bom para o mundo... Na minha grande ignorância, uma boa parte desses episódios e figuras célebres, não os conheço de lado nenhum. Em última instância, deixam-me indiferente, ou melhor, não mexem sequer um milímetro com a minha emoção e sensibilidade. Hoje, é proposta à devoção, pelo Google, uma vaga pintora Amrita Sher-Gil (1913-1941), filha de pai indiano e mãe húngara, judia.
Assim se passa também com acontecimentos históricos que não vivemos e de que não tomámos parte, ou até mesmo que ocorreram longe de nós, como se de outro mundo se tratasse, ao terem acontecido. Bem como a dilação no tempo provoca o distanciamento emocional e a frieza do conhecimento, sobre eles. Posso, por herança cívica e transmissão histórica, passar aos meus filhos a minha experiência sobre o 25 de Abril, mas devo ter em conta que a sensação deles será quase nula. Ouvir-me-ão, apenas, afectuosamente, com alguma atenção. Grande parte destas coisas são pessoais e intransmissíveis.
A ténue emoção com que vivi a queda do Muro de Berlim, porque distante, é outro exemplo significativo do que acabei de dizer. Hoje, é apenas um dado histórico. Nem sequer aureolado da bondade de que se rodeou ou foi incensado pelos meios de comunicação. Pergunto-me, muitas vezes, se a Guerra Fria, com o seu equilíbrio de mentores e pastores, não era um tempo e um mundo muito mais  tranquilo e pacífico para os seres humanos. Como me questiono sobre a utilidade prática das Primaveras Árabes, a médio prazo, que os media tanto aplaudiram, acriticamente.
Vivência, emoção e conhecimento, tudo deve ser pesado ao milímetro. Com prudente e saudável cepticismo. É um mau princípio embarcar logo na corrente dominante.
Só a Música, a verdadeira música, escapa ao crivo da razão. E, aí, não há nada a fazer...

7 comentários:

  1. Também não conhecia esta pintora. Quando abri o Google, gostei deste quadro e fui ver quem era a pintora; vi que tem muitos autorretratos. Vou geminar. :)
    Bom dia!

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  2. Concordo completamente com tudo o que diz.

    Gostei da pintura que não conhecia e já vi no Prosimetron...venho agora de lá!

    Desejo-lhe um bom fim-de-semana:)

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    1. Muito obrigado pela solidariedade.
      Muito Sol, por aí, para alegrar o seu fim-de-semana!

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  3. Tenho que fazer dois reparos, perdoe-me. O primeiro é que os Doodles, como eles chamam a essas variações do logo, existem desde 1998. O segundo é que não são tão americanocêntricos como isso. Há muita universalidade e muitos doodles regionais. Mesmo no Google.pt. Pode, para se entreter, procurar pelo arquivo que eles têm.

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  4. Veja, por exemplo, o doodle de 10 de Junho do ano passado http://www.google.com/doodles/portugal-national-day-2015

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    1. Agradeço a sua informação (não conhecia a palavra "doodle", por exemplo) sobre os vários aspectos do assunto.
      A ideia que eu tinha é que estes lembretes-efemérides eram, até há pouco tempo, mais espaçados, por isso mais raros, mas também a propósito de acontecimentos (e pessoas) mais significativos e importantes; e, agora, quase são diários, pelo que me apercebo. O que acaba por banalizar a intenção.
      Não me admira a propagação destes bonecos, porque também aí a globalização vai uniformizando tudo em clones sucessivos.
      Assegurando, assim, a tranquilidade da corrente dominante ("mainstream") e um gosto (?) que se pretende único, banal e geral.
      O que nunca me pareceu positivo, infelizmente.

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