quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

A par e passo 158


Advirto que é preciso ter atenção aos primeiros contactos com um problema que surge no nosso espírito. É necessário ser cuidadoso com as primeiras palavras que parecem identificar-se com uma questão do nosso pensamento. Uma nova questão aparece em nós de forma pueril; balbucia: não encontra senão termos estranhos, todos eles carregados de valores e de associações acidentais; sendo obrigada a pedi-los de empréstimo. Mas, por isso mesmo, altera insensivelmente a nossa necessidade verdadeira. Renunciámos assim, e sem dar por isso, ao nosso problema original, e acreditámos ter optado por uma opinião pessoal muito nossa, esquecendo que essa escolha não se exerceu senão sobre um conjunto de opiniões que fazem parte da obra, mais ou menos cega, do resto dos homens e do acaso. Assim se passa também com os programas dos partidos políticos, dos quais nenhum é (e não poderia ser) aquele que corresponde exactamente à nossa sensibilidade e aos nossos interesses.

Paul Valéry, in Variété V (pg. 131).

2 comentários:

  1. Interessante texto. Eu, de facto, não me identifico com nenhum partido político actual. Tenho sempre a sensação, quando voto, que estou a escolher o menos mau. Mas julgo que mais vale um menos mau do que outro pior ainda. Uma maneira cínica de olhar a política (a minha). Bom dia!

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    1. Eu não lhe chamaria cinismo, antes: pragmatismo.
      Os partidos vestem, quase sempre, a pele de quem os chefia. O que ocasiona distorções ideológicas que parecem absurdas...
      Bom dia!

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