sábado, 24 de abril de 2010

Abril, Mafra, 1968



Hoje, quando se fala do Convento de Mafra há, habitualmente, dois nomes que surgem por associação: D. João V e José Saramago. Mas há quarenta anos, para muita gente, a imagem do Convento ligava-se à Guerra e à Morte. A uma escola de aprendizagem a matar, e a "lavagens ao cérebro" minuciosamente estudadas e aplicadas. Os corredores do Convento de Mafra eram longos e frios, e as camaratas, ruidosamente ocupadas, não permitiam "outra intimidade, senão fechar os olhos".

Ao fim de três meses de recruta, os "infantes" eram chamados à parada, e alinhava-se o pelotão. Eram nomeados pelos números que acabavam em sessentas (64, 65...), do ano da inspecção. Chamavam os números e era uma espécie de roleta (russa). E, a seguir, diziam o destino: Transmissões, Comandos... Depois, mandavam destroçar e regressar às camaratas. O regresso até aos andares de cima, fazia-se em silêncio, mas ao chegar aos dormitórios, os sentimentos rompiam. Os gritos de alegria de quem ia para especialidades da burocracia militar, e o choro, pelos cantos, dos futuros "caçadores especiais"; e, pior do que isto, ainda era o "afunilamento" da Guiné (Corredor de Guilege, Madina do Boé...) onde, diariamente, morriam 2 ou 3 jovens de vinte e poucos anos. Era assim há quarenta anos para uma boa parte da juventude portuguesa.

4 comentários:

  1. Porque foi assim.
    Porque ainda dói.
    Porque estamos vivos.


    Um dia voltaremos.
    E sobre o mar as cicatrizes ficam
    livres da dor, do ódio desta guerra.
    Inútil e eterna esta lembrança
    breve e inútil como nossas vidas.


    Estranho! Tão estranho. Ao ler seu texto que muito me tocou, apareceu na memória isto, (versos?)que não sei donde vem.E apareceu tão presente como se fosse familiar, digo, conhecido, e rebuscando não sei o que é, donde vem, onde li,se li,...tão estranho como se outra vida... e eu não sou disso...
    Lapsos nde memória, sem dúvida.Lembrar e esquecer! Estranho!
    Gostei muito do texto...o resto não importa.

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  2. De "Um dia voltaremos " a "Vidas" deve estar<entre aspas. surgiu na memoria, não sei de quem é,é de cor (coração) devo ter lido e memorizado inconscientemente...
    muito estranho!

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  3. Será Bação Leal?, os versos também não me parecem estranhos...Entretanto, os seus comentários, Luís, foram-me um grato "reembolso".

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  4. Perdi lhe o livro, que o Pai publicou.E cheguei a comprar vários para dar de testemunho do que era, do que foi..
    Tinha um caderno(aliás 2) onde passava alguns poemas - nem sempre muito rigorosamente - e ditos que me impressionavam e cujos livros não podia comprar. Também perdidos... Algo fica na memória... é isso que vale

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