domingo, 2 de setembro de 2018

Atalhos e traições da memória


Graham Greene (1904-1991) gostava muito de Brighton e muitas vezes lá ia, ficando por uns dias, a saborear a estadia. Uma das suas primeiras ficções intitulava-se até Brighton Rock (1938). Desta cidade, à beira-mar, disse em Ways of Escape: "No city before the war, not London, Paris or Oxford, had such a hold on my affections". Isso não impediu que, nas suas memórias, não cometesse vários erros de pormenor, nomeadamente, em relação a números de autocarros da cidade, ou datas. Refere, por exemplo, que com 6 ou 7 anos, em 1911, teria visto, num cinema local, o filme Sophy of Kravonia, baseado numa história de Anthony Hope. Ora, o filme foi realizado apenas em 1920, o que invalida essa visão antecipada do escritor britânico...
A memória parece ter uma imaginação autónoma, por vezes, criando assim ficções improváveis. Não me atrevo, eu, a dizer, por exemplo, que filmes terei visto na Alemanha ou na Inglaterra. E vi, tenho a certeza. Posso, no entanto afirmar, garantidamente, que o primeiro filme que vi em Lisboa, da primeira vez que vim à Capital, foi "A Colina da Saudade", em 1956, no Cinema Tivoli, realizado por Henry King, com Jennifer Jones e William Holden. A música, Love is a Many-Splendored Thing, ficou-me para sempre na memória. Quase outro tanto, poderia dizer do único filme que vi em Paris, num salão de cinema, ronceiro e sujo. Em relação à data, ou foi 1963 ou 1964, mas em Setembro, de certeza. De seu título Les Diaboliques (1955), numa realização de H. G. Clouzot (1907-1977), com boas interpretações de Simone Signoret e Paul Meurisse.
Era um filme policial de qualidade, e impressivo, baseado num polar da dupla Pierre Boileau e Thomas Narcejac. Cujas imagens, de grande realismo visual, me ficaram na memória. Apesar de já se terem passado cerca de 55 anos...

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