segunda-feira, 30 de julho de 2012

Retratos (7) : Maria de Lourdes


Ali estava ela, à minha frente, muito bem arranjada, de casaco de peles (era Janeiro), para a entrevista. Tinha prática do ramo, mas o emprego e o ordenado eram  modestos para o aspecto que ela tinha - achei eu. E não lhe dei grandes esperanças. Dir-se-ia, hoje, que tinha "habilitações" excessivas para o lugar...
Mas aquela trintona, muito fresca, entre ingénua e sabida, deixou-me a ruminar. Falei nela ao Engenheiro: "...uma planturosa, de peles..." E ele: "E porque não experimenta? Não temos nada a perder."
Assim foi. Ainda para mais ela era do mesmo signo astrológico e decanato da Marilyn. E não me arrependi. A Lourdes era apenas um pouco desorganizada, frágil quando havia pressão, mas sobrava-lhe simpatia, era carismática e logo fez clientes fiéis, que lá iam só para a ver e falar com ela. Destoava, pela positiva, em suma.
Soube depois que não precisava de trabalhar: vivia com um Senhor, bastante mais velho e rico, numa vivenda da Praia das Maçãs. Mas Lourdes queria um mínimo de independência, mesmo que fosse só para os alfinetes. E, para minha surpresa,  vinha diariamente de carro e motorista. Ficou quase 3 anos na empresa.
Quando se despediu, deixou saudades a todos, e nunca ninguém a esqueceu. Fez, depois, sociedade com um antigo colega, mas o negócio correu mal...
Encontrei-a, por acaso, um dia na Baixa. Estava na mesma, simpática, o sorriso maroto e, ao mesmo tempo, não perdera a candura adolescente. Lembrei-me do casaco de peles.
Nunca mais a vi, nem soube mais dela. Disseram-me que tinha emigrado para a Suiça.

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