Não era alto, mas entroncado e de aspecto sólido. Óculos grossos, botas normalmente, e um sorriso ligeiro e amigável sempre a despontar nos lábios. Sabia ouvir. Nascera em Ílhavo a 31 de Julho de 1920, e eu sempre me dei bem com os nativos de Leão. O Mário (pseudónimo de Manuel Nunes da Fonseca) claudicava de uma das pernas - sequela de uma tuberculose óssea durante a adolescência -, e apoiava-se numa pequena bengala, ao andar. Conheci-o em 1964 ou 1965. A minha memória obstina-se em situar, alguns dos nossos encontros, no Calhariz, ou porque ele viesse do elevador da Bica, ou porque se tivesse apeado do 28. Mas seriam coincidências a mais... No entanto ele dava aulas na Escola Ferreira Borges, e o local faz algum sentido.
De qualquer forma, percorremos ambos, algumas vezes, a Rua Luz Soriano, até chegarmos ao DL. Depois, com vagar, subíamos as escadas, até à sala do DL-Juvenil. Frequentemente nos cruzamos com o F. Assis Pacheco, a descer. As reuniões eram à segunda-feira, de tarde, e foram muitas vezes encontros angustiosos, porque a Censura tinha cortado quase tudo das provas do "Juvenil", que lhe eram mandadas previamente para o "nihil obstat". E, nestes casos, havia que seleccionar segundas escolhas (textos, poemas...) para que as páginas não ficassem vazias, no dia seguinte. De uma vez, foi um texto meu, inócuo, que foi riscado integralmente pela Censura, só porque tinha, em epígrafe, uma frase (ou verso?) de Sophia Andresen.
O Mário era de uma afabilidade extrema e ninguém o poderia imaginar, se o conhecesse apenas dos textos contundentes e aguerridos, que escrevia no "Diário de Lisboa", de crítica à televisão. No "Juvenil" houve, muitas vezes, reuniões tumultuosas lideradas pelo Nuno Rebocho, que se opunha à sábia moderação do Mário. O Nuno, em tenra juventude, literariamente queria atacar e destruir o regime (Estado Novo) através da poesia. Grande parte dos seus poemas, berrantemente, se intitulavam "Manifesto (I, II, III...)" e, aí, o Mário, paciente, prudente e moderado, procurava conter, racionalmente, a ira adolescente do Rebocho.
Eramos tratados por "amigos", na sua voz bem timbrada, suave e afável, que nunca se alterava. E, na sua justa medida, o Mário era um verdadeiro chefe, na tribo. E foi assim até 1968, quando fui para a tropa.
Ao Mário, foram chegando, primeiro a Alice. Depois, a Catarina e o André. Depois, a morte, em 2002.
Gostei deste seu texto sobre o Castrim.
ResponderEliminarÀ direita, na foto, está o Luís Mateus.
ResponderEliminarAinda bem que gostou, MR. Creio que já me tinha falado do Luís Mateus, mas não tenho ideia dele.
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