quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Vergílio Ferreira, de novo, sobre Arte


Era frequente, nos anos 60 e 70 do século passado, que os catálogos de exposições de Pintura abrissem com palavras introdutórias de escritores portugueses, reflectindo sobre as obras  ou sobre a Arte, em geral. Eugénio de Andrade tem, por exemplo, magníficos e belos textos em catálogos de mostras de Resende, Ângelo de Sousa, José Rodrigues...
Os excertos de reflexões que vou reproduzir, de Vergílio Ferreira, iniciam um pequeno catálogo de uma exposição colectiva (Nadir, Dourdil, Pomar, Hogan, Skapinakis, Vespeira...) de pintura, realizada na galeria "Prisma", em Abril de 1973, em Lisboa. Seguem dois excertos:
"Falar hoje de arte instala-nos num certo mal-estar, ou numa certa má consciência. Porque antes de dizermos o que ela é, na realização dos que a realizam, submersamente se nos insinua a pergunta sobre se ela pode ser. E o facto de ela estar aí não é resposta bastante, como o não é sobre o romance a multiplicação dos romances, ou já sobre o poema épico a multiplicação deles no séc. XVII. Porque falar não é tagarelar. A fala instaura uma relação primordial com a vida e a tagarelice com a própria fala - tanto quanto uma relação com a vida não é já uma relação com palavras. Assim a sua multiplicação se estabelece no vazio. (...) Somente a arte é memória, e daí o que há de instável no seu equilíbrio de hoje. É uma memória que remete, se não para um referente (que em verdade reinventa), se não para um significado (que verdadeiramente o não é pela sua polivalência), remete ao menos para a recriação de um outro de nós, de um espaço a reorganizar, de um eco em que fale o seu silêncio, do intervalo em que se separe a sua materialidade da vibração que a transfigure no absoluto de uma presença. ..."

Sem comentários:

Enviar um comentário