sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Mercearias Finas 96


Tempos houve, em que não perdia uma crónica gastronómica de José Quitério (Tomar, 1942). O seu estilo rico, mas de singeleza clássica, muitas vezes castiça, tinha movimento interior, e era muito sugestivo na forma de nos reconstituir imagens e tempo, pelo ritmo da escrita. Em qualquer dessas crónicas, aprendia-se quase sempre alguma coisa sobre a arte de bem comer. Depois, eu cansei-me do "Expresso" - onde ele escrevia -, que se fora transformando numa instituição pesada de muitas coisas ligeiras; e perdi José Quitério de vista.
Por um acaso feliz, chegou-me às mãos, recentemente, um número da Revista do Expresso (de 10/1/2015), em que ele se despede (por problemas de visão) dos seus leitores, após 38 anos de crónicas gastronómicas semanais, através de uma entrevista, com algumas considerações bem interessantes. Aqui deixo alguns fragmentos, que sublinhei:

-...Por exemplo, não podes estar sempre a falar de bacalhau, bacalhau, bacalhau. Podemos dizer o gadídeo. Se calhar, alguém fica com os cabelos em pé, e diz «este gajo está armado em parvo». Mas não é isso - é para variar a linguagem. As pessoas falam cada vez com menos palavras.
-...A cozinha italiana é magnífica. Mas lamento imenso que os produtos mais divulgados da cozinha italiana sejam os mais vulgares e sem nenhum interesse gastronómico. Pizas e pastas, foi o que caiu na graça mundial, via EUA.
-...E depois há um medo português terrível de ser provinciano, quando a maior parte das vezes são. Vai-se atrás de tudo para se parecer cosmopolita. (...) O vinho é uma coisa que se tornou, ainda mais do que a comida, numa religião, numa liturgia, numa cerimónia. Perdeu-se a naturalidade de beber um copo de vinho.

3 comentários:

  1. Gosto imenso do José Quitério. Não sabia que tinha deixado de escrever no Expresso. Ainda não me chegou às mãos essa entrevista, mas chegará... Tb tenho um amigo que mo passa para eu dar uma vista de olhos. :)
    Espero é que José Quitério faça nova recolha de crónicas em livro.

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  2. E quanto ao vinho... é só vermos a quantidade de livro que têm saído ultimamente sobre o assunto. E livros de cozinha, nem se fala...

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    1. A entrevista é muito boa, mérito de quem a faz mas, sobretudo, de quem responde.
      As modas são para usar q. b. ..:-))

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