sexta-feira, 13 de junho de 2014

Da Janela do Aposento 47: Moldar o pensamento único



No caso em apreço, não vale a pena fazer uma declaração de interesse prévia, porque nunca participei, de uma forma consciente e assumida, na terrífica engrenagem dos exames nacionais. Sujeitei-me, consequentemente, ao estatuto menor da docência, i.e., não leccionar a matéria do 12º Ano. O que para alguns era a “cereja em cima do bolo”, o último ano sempre o considerei um tempo perdido para o essencial, a saber, o de contribuir para pensar, com autonomia, saber e empenho.

Convenhamos que, há muito tempo, os exames nacionais, introduzidos com o argumento de peso de tornar a avaliação final mais objectiva, contribuem para treinar criaturas a reproduzirem determinados chavões. Basta olhar para os chamados “cenários de resposta”, que os alunos são instigados a “encornar”, para perceber o enquadramento formal e ideológico dos correctores, reduzindo as respostas ao “grau zero da escrita”.

Ora, o que o mais tosco estudante de Línguas e Literaturas devia ter apreendido na sua passagem pela Universidade é o facto de qualquer língua constituir um sistema de combinação inifinita – graças aos seus criadores – o que faz com que nenhum texto, tanto sobre matérias exactas como de literatura, seja idêntico. Felizmente, e em louvor da LÍNGUA !

Olhando, pois, para a deriva dos exames nacionais que, vergonhosamente, enriquecem determinadas editoras, publicando reproduções de exames oficiais anteriores a preços exorbitantes, fica a tristeza e a revolta profundas perante tanta falta de seriedade, brio profissional e sentido democrático na defesa da língua e da literatura.

Como não faz parte do meu universo desejar “sorte” aos examinandos, porque considero que uma prova, qualquer que ela seja, se destina a avaliar um quadro de referências linguísticas, literárias, culturais e sociais, construído paulatinamente e que nos permita, com autonomia, pensar a vida e o mundo que nos rodeia, resta-me a apreensão perante mais uma amputação de cidadania, implícita nos exames nacionais que se avizinham.

Portanto, o ressurgimento das sebentas, no ensino universitário, não me espanta. É a consequência lógica de um “bom caminho” que a educação está a traçar. E que ele seja, de preferência, em Inglês, a bem da internacionalização !

Post de HMJ

2 comentários:

  1. O "rei vai nú" mas ninguém repara. E quem repara é morto!

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    1. Para JAD:
      Pois. E, por vezes, a matança faz-se com requintes de malvadez.

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