quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Divagações 18


A voz interrompeu a noite, e vinha da infância, reconhecível e amiga. Como, nessa altura, vinha da Costa ou da pequena colina de S. Roque, o musgo fresco, verde escuro, para o Presépio. Trazia-o a leiteira que, matinal e diariamente, sobre a rodilha à cabeça equilibrava também o grande cântaro de leite que vinha vender pela cidade. O que sobrasse levava-o para vender na dita "Feira do Pão" onde, pouco antes do Natal, aparecia algum (pouco) Pão de ovelhinha (que eu chamava, em corruptela: "de bilhinha"), ou o pão de Padornelo que era o melhor para fazer os mexidos natalícios.
A desconstrução da infância faz-se pela revelação dos segredos, pouco a pouco. Pela destruição dos heróis, pela explicação prosaica dos mitos. Pelo acabar dos medos. Ainda a lenha, o fogão que ardia cantante no estrelejar da carqueja e nos estalidos dos cavacos ressequidos, quando o Sidónio disse, triunfante: "Não há Menino Jesus! São os pais que põe os presentes de Natal, nos nossos sapatos, durante a noite..." Terá sido pouco antes do dia 25, pouco antes do fim da infância. Devia eu andar pelos 7 anos. Comecei a crescer, então, para dentro da realidade, com mais força. E desconfiança.

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