1. Outubro de 86, num café do Porto: um pintor e um poeta. Este pergunta ao Pintor se ele sabe o paradeiro de todos os quadros que fez. O artista responde que há dois que não sabe onde estão. E, num guardanapo de papel, com pequenas e breves hesitações de traço, desenha-os, linearmente. O Poeta diz-lhe: "- Do triangular, sei quem o tem!" O Pintor explica que o título do quadro é "O Massacre de Chicago", em homenagem à liberdade de associação sindical; e, depois, interroga: "- Onde está?" O interlocutor responde, cauteloso, em termos vagos: "- O dono, sei que está em Madrid..." O Pintor, após um ligeiro silêncio, exclama: " - Diga-lhe que pode ficar com ele."
2. Maio ou Junho de 86, um pai e um filho, depois de jantar (o filho dirá, mais tarde, que foi antes do jantar e que nem chegaram a comer juntos), dirigem-se para a Feira do Livro, no Parque Eduardo VII. Vão comprar, aproveitando os descontos, um livro com um auto de Gil Vicente, de que o jovem precisa para a Escola. Junto do Pavilhão Carlos Lopes há um monte de lixo e sucata, restos de fórmica e esferovite espalhados pelo chão - despojos da exposição-celebração do 15º aniversário da CGTP. Mas, no meio, e nas costas de um contraplacado de 1,20 x 1,20, há um nome: Angelo de Sousa. O filho não sabe quem é, mas o pai sabe. E, uma hora mais tarde, o quadro, de táxi, atravessará o Tejo, em direcção à Outra-banda.
3. Algures no séc. XXI, de novo, no Porto. O Pintor e o filho do homem encontram-se e conhecem-se durante uma exposição. O jovem fala ao Pintor (que se parece com o João César Monteiro, mas é menos desbocado), já sexagenário, do quadro "O Massacre de Chicago" e confirma-lhe que o pai o tem, pendurado, na sala do pequeno apartamento de Lisboa. O Pintor pede, então, ao jovem que tire uma fotografia da obra e lha mande. O jovem diz que sim. Mas com a falta de tempo e os trabalhos, nunca chegará a enviar a foto. E, entretanto, como diz a canção do José Afonso - "O Pintor morreu..."
para A. de A. M. e ms, e à memória de Angelo de Sousa.
É incrível. O quadro deve ter sobrado de algum leilão da CGTP.
ResponderEliminarAinda bem que o pai e o filho passaram por lá e o pai sabia quem era o Ângelo de Sousa. Quantos teriam por lá passado antes e olharam para o monte de "lixo"?
É o que faz deixar o "lavar dos cestos" às empregadas de limpeza...,sobretudo, quando "a vindima" é de Pintura Moderna...:-)
ResponderEliminarSão tão boas e belas as memórias. Eu, numa situação dessas, teria de estar com o rapaz cá de casa para saber que o que estava a ver era verdadeiramente arte e importante, confesso! Pelo menos o pintor ficou a saber que o quadro estava bem entregue, a quem o soube apreciar e distinguir a arte no meio de restos de nada, nem de coisa nenhuma!
ResponderEliminarBoa tarde (e adorei ambas as histórias)
P.S. Vou estar tão mais atenta a restos de exposições, se passar por alguma :-)
É possível que, na altura, Angelo de Sousa nem fosse dos meus pintores preferidos mas, com o tempo, fui-me afeiçoado a este quadro e, hoje, gosto muito dele. Por outro lado, o Pintor tem uma obra sólida e coerente, que ainda hoje é apreciada e valorizada.
EliminarP.S.: boa sorte!..:-)
Muito interessante!
ResponderEliminarNão percebi foi a primeira parte...quem estava com o pintor? ...
Boa noite:)
Um grande amigo meu, do Porto, que sabia da história e já tinha visto o quadro.
EliminarAh, já percebi! Estava curiosa...
ResponderEliminarSe dúvidas houvesse, essa conversa tornou totalmente legítima a posse do quadro!
Que historia interessante e curiosa:)
Boa tarde:)
Afinal já cá tinha estado...não me lembrava.
ResponderEliminarOs quadros são bonitos e acho que tenho algum livro ou desdobrável sobre o pintor...se calhar estou baralhada.
Bem, daqui por 6 anos, torno a vir ler esta história, interessante, por sinal!
Boa tarde:))
Pois venha.
EliminarE seja bem vinda!
Que maravilha de história e que bela aquisição. Boa tarde!
ResponderEliminarAssim foi, realmente!
ResponderEliminarBom dia.