sábado, 30 de março de 2019

Profissão assistida


Já Nicolau Tolentino se queixava de ter que aturar meninos, na sua profissão de mestre-escola, para sobreviver economicamente e poder ter algum tempo, ainda livre, para dedicar ao seu prazer maior que era escrever poesia. Esquecia ou, melhor, omitia que o vício do jogo lhe consumia uma boa parte dos rendimentos auferidos... Melhor sorte teve José Daniel Rodrigues da Costa, seu contemporâneo, que conseguiu viver do que escrevia e publicava, mas teve que trabalhar muito e deixar obra larga.
Que isto da poesia não é boa enxada, nem lucrativa, pelo menos, em Portugal.
De prosas viveu Camilo, mas teve que se esgadanhar a escrevê-las. E se não fossem os bens e rendimentos da Dª. Ana Plácido, provavelmente, ainda teria vivido pior. Eça também se queixava muito, apesar de escritor de sucesso e diplomata em exercício, que não seria mau ofício quanto a salário, decerto. No século XX, só me lembro de Ferreira de Castro e Agustina terem vivido da pena. Cesariny, só quando se desdobrou em pintor, é que teve um crescente desafogo na bolsa. E foi pela pintura que enriqueceu.
Li em Le Monde, recente, que são raríssimos, em França, os escritores que não têm uma segunda profissão, para poderem sobreviver. Lá como cá, seguramente.
E dos novos lusos publicistas? De tão fraca laia e escrita de água chilra? Viverão de biscates e croquetes de vernissages? É que muitos deles nem sequer chegam à mediocridade rentável de Houellebecq, que lá vai vivendo, em França, do que escreve. Tem, por ele, a sorte dos seus leitores não serem muito exigentes. E o sentido crítico, em grande parte deste mundo, andar pelas ruas da amargura.

5 comentários:

  1. Aquilino no princípio da sua vida adulta foi jornalista, bibliotecário e professor, mas quando regressa do exílio (não me lembro em que ano) passa a viver da escrita.
    Bom dia!

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  2. Cesariny, para sobreviver, chegou a ser jornalista num jornal automobilístico (O Volante?) e não sabia guiar... :-))
    Bom sábado!

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    1. Realmente, esqueci-me de falar de Aquilino. Mas eu creio que ele foi "príncipe-regente" dos bens de Dª Jerónima, que alguma coisa herdara de Bernardino Machado..:-)
      Bom fim-de-semana.

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  3. Lembrei-me de dois exilados, que não deveriam ter tirado muito
    proveito da escrita. Jorge de Sena e José Rodrigues Miguéis.
    Injustamente mal amados neste país.

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    1. Ambos se queixam, na correspondência, de dificuldades financeiras. Mais, Sena, por causa da grande prole (9 filhos?).
      Havia sobretudo inveja, em Portugal, da parte de alguns confrades, pela qualidade destes dois homens...

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