segunda-feira, 18 de abril de 2016

Divagações 110


Quase sem dar por isso, as pessoas vão-se enredando no lodo dos dias. Dos menus repetitivos, onde constam irremediavelmente, se querem peixe, a dourada, o salmão, a perca do Nilo ou o robalo que, graças à moda, à aquicultura e às rações industriais, sabem de forma medonha a limo e  à poeira marítima.
Isto, quanto a gastronomia, porque no que diz respeito à indumentária ou à cultura, os padrões são ainda mais exíguos, invariáveis na escolha, seguindo acarneiradamente a mainstream vigente, num receio pueril de destoar dos rebanhos clonizados pelas agências de propaganda. Porque aos poderes importa, sobretudo, a padronização colectiva, para poderem dominar melhor. Quando muito, criam uma ficção de rivalidade dual que também divide, artificialmente, para simular a liberdade e a opção de escolha. Falsas, todavia.
Matou-se um pouco, nos tempos que correm, a irreverência e a frescura criativa da juventude, que hoje é muito mais capturável. Dir-me-ão que ainda há o califado islâmico e a igreja universal do reino de deus - e é verdade. Como há Dior e Prada, o Paulo Coelho e a Rosa Montero, o Possolo do Cavaco e a Landau, o Rieu da música clássico-pimba, a Lady Gaga e outros quejandos entreténs anódinos e inúteis. Enfim, uma enormidade de abstracções inócuas que conservam uma boa parte da juventude na quietude absoluta e hibernante. E calada, até para não perturbar o exercício tranquilo e sacrossanto das off-shores. Por onde andarão agora as adolescentes e cristalinas Primaveras Árabes e os jovens correspondentes aduares europeus de imitação? E será que os Indignados, que tantas capas de jornais fizeram, já se tornaram dignos? Tão puros, tão autênticos que eles eram, na sua indignação!... Entretanto, no Brasil, os caboclos vão-se entretendo com o impeachment da sra. Dilma. A cada um, a sua chinela ou alpergata, de marca original ou contrafacção. Como diria o João César Monteiro: "Dêem-lhes trabalho, dêem-lhes trabalho..."
Amém.

8 comentários:

  1. Quanto às comidas, há modas, como o pudim flan, o doce da casa, a baba de camelo, o cheesecake, etc. que se vão substituindo.
    Na indumentária, acho que já foi pior: era a ditadura das saias compridas, das mini-saias, das camisolas justas e curtas, da roupa larga, etc. Agora parece-me que se vê um pouco de tudo, de acordo com uma certa 'moda', mas principalmente com o que as pessoas se sentem confortáveis. A não ser nos sapatos, que também há de tudo, mas ninguém se pode sentir confortável com saltos de 10 cm e de biquinhos muito fininhos.
    No meu ponto de vista, a Rosa Montero não é propriamente o Paulo Coelho. E a Lady Gaga tem uma grande voz. Foi para mim surpreendente a homenagem que ela fez a Julie Andrews e ao Música no Coração.
    As Primaveras Árabes sabemos como estão. E os Indignados, que zurziam nos partidos, fizeram-se partidos. E também sabemos como estão.
    Boa semana! E boa viagem!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Com net intermitente, vou tentar ser breve.
      A obsessão com a moda, sobretudo na juventude, criou ou favoreceu a padronização. Se lhe juntarmos falta de sentido crítico, aí temos os rebanhos.
      Mas a minha "metafísica" também pode ser uma "consequência de estar mal disposto", como dizia o Pessoa.
      Obrigado. Boa tarde!

      Eliminar
  2. Agora, lembrou-me precisamente um desses deputados brasileiros (consta que também pululam pelos Estados Unidos da América)que citaram profusamente «deus» no debate de ontem, sobre o impedimento do Dilma. Alguns também clamaram «amém!». ;-)
    Pois é verdade que os dias de hoje são mais «propênsicos» a uma certa uniformidade (se é de mau gosto, isso é outro assunto), mas, apesar de tudo, considero que devemos relativizar as coisas. De cada vez é mais difícil (i) manter um consumo, ainda que moderado, que se baseie nos recursos naturais, ou pouco transformados, pois o planeta não chega para todos, principalmente se queremos que todos tenham acesso à dignidade (noutros tempos era mais fácil, os que «tinham direito» eram menos); e (ii) ser original no vestir, no falar ou nessas coisas mundanas. Já quase tudo foi inventado (até nas ideias é de cada vez mais difícil ser original)e, francamente, os homens (e as mulheres) de hoje já viram coisas de espantar, em tal quantidade e qualidade, que já não é qualquer minudência que as desperta.
    Nota-se um certo conformismo, é verdade. Mas vamos ser otimistas: isso é porque a esquerda agitadora e os indignados agora estão na mó de cima, conquistaram o poder, e já não lhes convém abanar a sociedade e as instituições. Os jovens e a populaça, esses, não sabem bem o que fazer, pois também deram conta que os seus ídolos alternativos eram, afinal, burgueses à procura do seu lugar ao sol. Quando a verdadeira revolução acontecer, as mentes vão de novo despertar. Os indignados e o Bloco de Esquerda não são a revolução.
    Vou citar duas canções sobre isto e calo-me já.

    Antônio Carlos Belchior escreveu em 1976 uma canção que Elis Regina imortalizou e que dizia:
    «... Minha dor é perceber que apesar de termos
    Feito tudo, tudo, tudo, tudo o que fizemos
    Nós ainda somos os mesmos e vivemos
    Como os nossos pais...»

    Em 1970, um grupo de ativistas/artistas norte-americanos (The Last Poets) cantou:
    «When the revolution comes some of us will probably catch it on TV, with chicken hanging from our mouths. You'll know it's revolution cause there won't be no commercials...».

    Ainda não foi o caso.

    ResponderEliminar
  3. Mal servido pela net, vou tentar responder sucintamente.
    Eu acho que há um gosto acentuado de padronização na juventude: as etiquetas de marca à vista, os "je suis Charlie", as velas e florinhas para Lady Di...
    Quanto à América, God a Blesse, porque até o Iraque foi uma espécie de guerra santa bushiana...
    Mas a Elis tinha razão.
    Saudações alentejanas!

    ResponderEliminar
  4. Boa noite, não queria pessoalizar muito o espaço mas, fiquei de lhe dar nota de um vinho tinto Moldavo, não o posso fazer porque tratou-se de um equívoco, afinal tratava-se de uma garrafa de Rioja de Heras Córidon, que acabei de Abrir e posso dizer, excelente, um vinho com um palato dos grandes vinhos muito equilibrado e elegante, as castas são espanholas, em baixo um atalho para um sitio com belíssimas imagens onde poderão vês as caves moldavas de que falei, tem de pesquisar no sitio claro, e um atalho para 3 garrafas, a de hoje, que acompanhou umas favas divinais com um ovo escalfado no ponto, uma chouriça do melhor, e como sobremesa uma laranja que era mel, há dias assim em que tudo corre bem, a 2,ª garrafa é de vismos da Moldávia um grande brandy talvez o melhor que já bebi, e a 3-ª que pode rivalizar com a garrafa espanhola da mesma faixa de preço o Quinta da Espinhosa de Tazem que aconselho a provar, a finalizar o meu almoço de páscoa foi regado com vinho do agricultor também de Tazem, sabe bem beber umas coisas mais rusticas, muito bom o vinho encomendei dois garrafões.
    http://mab.to/yi65umi7u
    http://invinoviajas.blogspot.pt/

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Obrigado pelas suas informações.
      Devido a dificuldades na net, por aqui me fico, com as melhores saudações.

      Eliminar
  5. O teor deste poste dava pano para mangas e seria bem interessante
    uma boa conversa à volta de uma mesa. Concordo com algumas coisas
    das diversas opiniões de todos, no entanto quero acrescentar em
    relação à juventude actual, as novas tecnologias que os afastam
    da realidade envolvente. Nem sei se muitos, serão capazes de olhar
    ou sentir as pequenas coisas que os rodeiam.
    Boa tarde.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Muitas vezes, o adormecimento da juventude enerva-me. Ou o fascínio pelas coisas acessórias, de importância minúscula, nunca essencial.
      Aceito que o teor deste poste possa ser exagerado, mas é evidente que o quis polémico. Para acordar, para alertar, mesmo que pela caricatura.
      Boa noite, Maria Franco.

      Eliminar