quarta-feira, 30 de abril de 2014

Apontamento 44: O encontro de miseráveis



Se tivesse capacidade e dotes especiais para transpor factos reais para um universo de ficção, engenho e arte que, de facto, não me foram concedidos, poderia transformar um evento insólito, presenciado, numa prosa com laivos de verosimilhança.
Na ausência de dotes superiores, fico-me pela narração factual de um encontro de miseráveis, claro está, falando de condição social e mental, tão ao sabor dos nossos tempos.
Imaginemos, pois, um “artista português”, falando alto para dar nas vistas, a aproximar-se do seu local de trabalho. Neste caso, o Teatro Municipal S. Luís, em Lisboa. Berrava, de dentro da sua viatura, para uma nova figura típica de Lisboa, o “arrumador” – sabe-se lá da quantidade de “arrumos” de que ele vive. Eles são tantos ! Como o artista não conseguia um lugar de estacionamento, maçada reservada aos restantes cidadãos, recorreu ao “lobby dos arrumos” estabelecido, há muito, na zona. Ele até anda com um molho de chaves de tanta gente, mais uma não lhe faz diferença nenhuma. E ter a chave de carro de um artista, mesmo por minutos para lhe fazer o “serviço”, até lhe dá uma certa “ficha” e promoção social na miséria que nos cerca.
O processo até é simples. O presumível cliente pára o carro num sítio, entrega a chave ao arrumador e vai à vida.



Ele faz o trabalho dele, frequentemente barrando um lugar ao cidadão comum, para servir o “seu cliente”. Foi o que aconteceu.


Apenas uma completa ausência de princípios morais e cívicos poderá explicar essa profusão de “lobbies”, do mais comezinho e miserável ao mais elaborado e pernicioso, vivendo sempre da conivência e do pequeno “jeito”, de “siguranças” a arrumadores e quejandos, em vez de se empenhar na construção de uma democracia adulta, em que a lei e as regras são de cumprimento e respeito obrigatórios para todos.

Enquanto uma Câmara Municipal da capital de um país tolera esta subversão, e até os agentes de autoridade declaram desconhecer semelhante fenómeno, estaremos longe de uma democracia real em que o cidadão cumpridor e consciente não se sinta esmagado por esse mundo de “novos miseráveis” em ascensão.

Post de HMJ

6 comentários:

  1. E assim vai o mundo ( com letra pequena )

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  2. Respostas
    1. Para MR:
      também acho. Mas quem sou eu para achar ! Os "siguranças" do Teatro até emprestam os pilaretes para reservar lugares de estacionamento para os tais "clientes particulares". Mas a PSP atesta que nunca viu nada. Devo ter um defeito na vista ou problemas de percepção.

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  3. O que se passa com o estacionamento em Lisboa é uma pouca vergonha e a CML não faz nada. Assobia para o ar.

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