Considero que o benefício de poder ”con-viver” com duas
culturas, ou duas línguas, é um privilégio de consequências ilimitadas para o
ser humano, embora abordado de forma leviana por alguns opinadores, reduzindo-o
a aspectos acessórios.
Na conquista do espaço do “alter”, ou seja, no esforço de
entrar no universo do outro – da sua História, Cultura e suas Tradições –
orienta-nos, como guia, a sua língua e, quiçá, as linguagens específicas. Desse
esforço surgiram, ao longo dos anos, prazeres estranhos como é o caso de
coleccionar Gramáticas, genericamente falando, da Língua Portuguesa.
Embora sem rigor científico do ponto de vista da
linguística, arrumo os meus interesses e a consequente tentação de aquisição em
quatro grandes áreas, ou seja, as Gramáticas históricas, as filosóficas, as
didácticas e as “actualizações académicas”.
Pouco interessa para o caso de nunca ter completado, por
inércia ou falta de lembrança, uma lista bibliográfica das Gramáticas que vou
coleccionando.
Interessa-me, sobretudo, o enriquecimento mental que vou
tirando da consulta de Gramáticas. Nas Gramáticas "históricas", i.e.,
as primeiras impressas durante o século XVI, aprecio a riqueza expressiva,
frequentemente claríssima, na exposição de fenómenos complexos da estrutura da
língua.
As Gramáticas chamadas “filosóficas”, como a de Soares
Barbosa, encaminham-nos para uma reflexão abrangente sobre a(s) língua(s) e
que, por vezes, se completa com ensaios de George Steiner.
A secção das “didácticas”, e por antigo dever de ofício,
reúne o maior número de exemplares, embora de qualidade descendente numa
perspectiva diacrónica, do passado para o presente, centrada no século XX. De
alguns “abortos” das últimas três décadas não reza o acervo, porque não tinham
a qualidade mínima para fazer companhia aos “amiguinhos” mais velhos.
A actualização na compra de Gramáticas e relativamente aos
Estudos Linguísticos foi cedendo ao gosto, em detrimento da obrigação de
acompanhar o vasto leque de novas achegas, circunscrevendo-se ao interesse
pessoal, à autoridade e ao apreço por determinados académicos.
Dito isto, e atendendo à capa de um dos mais recentes
livros “afins” em epígrafe, pretendia falar do que, actualmente, se designa por
Pragmática, i.e., e sem rigor científico, um olhar para a língua quando usada e
aplicada em determinados contextos de comunicação. Ora, vejamos uma página do
dito “livrinho” de Rosa Maria:
Considero que determinadas áreas da Pragmática, por
referência a contextos culturais próprios de cada língua, exigem um esforço
suplementar ao forasteiro, revelando a sua sensibilidade à diferença e à
aceitação do outro. Confesso que a brochura sobre a “Economia Doméstica” me
deixou, pragmaticamente, perplexa. A linguagem, embora adequada a um
livro “singelo” de instruções básicas, acusa uma vertente que, até agora, me
tinha escapado. A saber, o cunho ideológico no uso da língua, aspecto peculiar
que nem a última Gramática, publicada recentemente, ajuda a integrar no
universo da língua.
O que despoletou, certamente, esse olhar crítico sobre o
cunho ideológico de determinados discursos foi um artigo de George Steiner, “O
milagre oco”, em que ele aborda o pós-guerra na Alemanha e sublinha que o
“problema das relações entre a linguagem e a inumanidade política é
fundamental”.
Com efeito, o contexto da comunicação, ou seja, a
Pragmática, não se situa fora do quotidiano político e social dos falantes.
Este livrinho deve ser muito curioso, a julgar pelas páginas apresentadas...
ResponderEliminarBoa noite!
Para Isabel:
Eliminartanta curiosidade despertou que mereceu um "post" !
Este livro de Rosa Maria não conheço; tenho é vários livros de cozinha dela.
ResponderEliminarA senhora que se serviu deste livro e que, a atentar pelas anotações, o levou a sério, não era dada à leitura nem às distrações, substituindo-as pela lavagem de roupa fora de casa. :)
Bom dia!
Para MR:
Eliminarnão consegui saber o ano da edição, nem pela editora :(
Quanto ao «cunho ideológico de determinados discursos» são bem visíveis em livros de estudo (Estado Novo, por exemplo) e nos manuais de civilidade (1.ª República, por exemplo), locais ideais para passar a 'mensagem'. Falo destes exemplos que são os que conheço melhor.
ResponderEliminarE ainda em livros como os que apresenta, em que o exemplo mais conhecido é o de Laura Santos e a sua Escola de noivas (acho que é assim o título).
Para MR:
Eliminarfez bem em lembrar outros discursos, porque sempre achei piada aos "manuais de civilidade".
Um tema muito interessante. Fiz um trabalho, em tempos, sobre uma revista infantil do Estado Novo, «O Senhor Doutor», que também tinha um discurso muito curioso, nesse caso dedicado às crianças.
ResponderEliminarPara Margarida Elias:
Eliminarobrigada pela informação. E de pequeno se torce ...
este bem que podia ir parar à minha rubrica do ´Para totós'
ResponderEliminar:)
Para Tétisq:
Eliminarantecipei-me :)
legal!
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