sexta-feira, 17 de julho de 2015

Apontamento 73: "Uma crítica da linguagem"



Falando, como sempre, com conhecimento de causa e propriedade intelectual, cultural e, sobretudo, linguística e literária, António Guerreiro debruça-se, na sua última intervenção cívica, sobre o jornalismo.

O seu texto coincidiu com alguns excertos de – bom e mau – jornalismo que andei a coleccionar ao longo do dia. De forma tranquila, li e guardei, para memória futura, uma parte de um texto de Viriato Soromenho Marques, no DN de hoje, autor que, como sempre, se destaca pela capacidade de se centrar na essência e numa propriedade linguística já fora do comum:

1 – “Mas, rompendo o véu obscuro da novilíngua do Eurogrupo, se a "confiança" (leia-se, submissão) não for demonstrada, o "acordo" (leia-se: ultimato) falhará. Nessa altura, talvez a Grécia seja arrastada para fora da zona euro numa explosão de desordem e violência social. Com isso, a zona euro entrará na lista infame dos crimes contra a humanidade.”

Viriato Soromenho Marques, DN, 17.7.2015

O mau jornalismo, ou seja, aquele em que “a crítica da linguagem” se encontra perfeitamente ausente, revelando uma transmissão “acrítica” de aberrações constitucionais, sociais e pragmáticas:

2 - «As Finanças reforçam que “o novo regime de deduções baseia-se no sistema e-fatura e nas novas tecnologias, o que garante um regime simples e sem burocracia ou papéis, em que as despesas reais de cada família são registadas de forma automática e eletrónica no Portal das Finanças. O regime permite também, pela primeira vez, que os contribuintes consultem as despesas que realizam ao longo do ano e acompanhem em tempo real a evolução da respetiva dedução no IRS, e permite ainda que a administração fiscal possa pré-preencher totalmente a declaração de IRS e, dessa forma, simplificar e facilitar a vida a milhões de famílias portuguesas”».

Ana Sofia Santos, Expresso, 17.7.2015

Ora, para a jornalista do Expresso, à semelhança do Senhor Provedor de Justiça, não existe nenhuma “falha de ordem Constitucional relativamente  a conceitos de igualdade de direitos dos cidadãos”, quando se institui, como obrigatório, um regime de deduções no IRS baseada numa plataforma electrónica.

A excelência de um “regime simples e sem burocracia ou papéis” não será para os “info-excluídos” – voluntários ou obrigatórios – sem nenhuma hipótese alternativa. Aliás, a senhora jornalista nem sequer chega a avaliar questões de essência.

Na sua promoção dos “superiores serviços da AT” nem sequer consegue explicar a “retroactividade de despesas de saúde” que, passados 6 meses, obrigam a juntar uma receita médica para uma compra simples de um BEN-U-RON.

Resta acrescentar, como proposta para o Senhor PM apresentar na próxima reunião de líderes, voltando a brilhar com as suas prestações de excelência, que a Alemanha siga o exemplo português. Sucede que as farmácias na Alemanha nem recibo passam ou entregam !

Post de HMJ

5 comentários:

  1. Concordo com tudo o que diz, mas parece-me que a junção das receitas é só para produtos com taxa de 23%, como já era necessário. Foi o que percebi. Agora é necessária receita médica para tudo?

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    1. Para MR:
      Pedem receitas retroactivas ??? Em Julho alguém se lembra de pedir receitas de Fevereiro ?

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    2. Mas agora temos de guardar as receitas todas?! Pensava que só era necessário, como sempre foi, para os medicamentos com IVA superior a 6%.

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    3. Para MR:
      na malfadada página e-factura (=TPC do cidadão a favor da AT) surgiu, há pouco tempo, talvez duas semanas a indicação para juntar a receita médica. Ora, como introduzi - obrigatoriamente - as despesas na farmácia, não houve, até agora, tal obrigação. Agora tenho uma despesa de Fevereiro para juntar a receita, já nem sei o que comprei, nem sequer se tinha ou não receita. O mais certo é que estas despesas já não entram no abatimento para o IRS. Ora, mais uma forma de reduzir as despesas de saúde como o Senhor Ministro apregoa.

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  2. Obrigada pelo esclarecimento. É sempre a sacar.
    Bom domingo!

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