sexta-feira, 16 de março de 2012

Camilo


É, no mínimo, curioso que Camilo (1825-1890), nascido em Lisboa, nesta freguesia da Encarnação - donde também escrevo este texto, para um poste - tenha abordado, maioritariamente, na sua obra temas da província e do Minho; e Eça de Queiroz, nascido na Praça do Almada, da Póvoa de Varzim, de "mãe incógnita" (suprema ironia!), tenha escolhido, para local do enredo de grande parte dos seus romances, Lisboa e ambientes citadinos. Isto faz com que, muito boa gente, os prefira, ainda agora, em detrimento dos dramas campestres camilianos. Passa, hoje, mais um aniversário de nascimento (16 de Março de 1825) do autor de "Amor de Perdição". Mas é com o início de "Volcoens de Lama", numa espécie de prefácio intitulado "Rasão do Título", que vou lembrar Camilo Castelo Branco. Com ortografia original da 2ª edição (1898) da obra, segue:
" Ordinariamente quando, em estylo metaphorico usamos comparar as férvidas paixoens de alguns homens aos vulcoens, a comparação vae buscar o simile ás cratéras do Etna, do Hecla e do Vesuvio. Presume-se pois que os antros do coração humano resfolgam fogo de paixoens assoladoras como os intestinos do nosso globo jorram arroios de lava candente que subvertem, devastam, devoram, pulverisam ou petrificam toda a natureza viva e morta que abrangem nos seus braços de lavaredas.
Todavia, ha ahi na casca do planeta paixoens humanas cujo simile não o dá o Vesuvio, o Hecla nem o Etna. É de Java que elle vem - de Java onde estuam convulsionados uns vulcoens de lama que expluem o seu lodo sobre as coisas e as pessoas, primeiro emporcalhando-as, depois asphixiando-as na sua esterqueira espaçada.
N'este romance estão em actividade permanente, sempre accesas, as cratéras das paixoens da aldeia, mas tambem volcanisadas, exterminadoras; mas sujas de uma porcaria nauseabunda - volcoens de lama, em fim.
Tal é a rasão do titulo."

2 comentários:

  1. Não me lembro de ter lido Vulcões de lama. e fiquei com vontade de o fazer.

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  2. É um título camiliano pouco falado, MR, não sei se por ser uma obra menor. Eu vou no princípio.

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