Dia Internacional da Criança? Pois seja...
Quando eu era infante, aqui há muitos e muitos anos atrás, uma das coisas que eu mais gostava era de ir, com a Maria, à Praça, logo pela manhã. E, no Mercado, onde eu mais gostava de entrar era no talho do Zé Bento, marchante corpulento, de bigode saraivado, mas que tinha, além dum vozeirão, um sorriso menino acolhedor. Parecia-me entrar numa segunda casa... E talvez seja por isso que eu gosto, ainda hoje, das pinturas de Soutine. Além disso, era rara a vez em que eu não encontrava, lá dentro, alguma coisa preciosa, no chão. De uma vez, foi uma moeda de 2$50, uma fortuna para a época e para a minha altura, que tinha 1$00 de semanada; noutra ocasião, foi uma medalhinha de S. António, em ouro, que ainda conservo.
Ora hoje, Dia Internacional da Criança, ao folhear a revista da minha Freguesia, nas páginas dedicadas às Marchas Populares de Lisboa, dou de caras com o senhor "Vítor Silva (, que) foi marchante durante 20" (anos). Claro que me lembrei logo do Zé Bento, marchante vimaranense. De boa memória, na minha infância. Mas depressa se desfez o encanto e houve um curto-circuito de memória. Porque este Vítor Silva nunca foi cortador, como se chama em Lisboa aos marchantes. Usa, impropriamente, um atributo nobre minhoto. Este alfacinha é apenas um vulgar acompanhante das Marchas Populares lisboetas... Não é um Zé Bento, notável artífice na arte da desmancha ou desossa de carnes.
E assim se desfez mais um sonho vocabular de infância, na criança que eu, outrora, fui.
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