quinta-feira, 9 de junho de 2016

A par e passo 168


Pensemos numa pequena criança: esta criança traz em si um conjunto de possibilidades. Ao fim de alguns meses de vida, ela aprendeu, quase simultaneamente, a falar e a andar. Adquiriu, assim, dois tipos de competências. Isto é, possui agora duas espécies de possibilidades, cujas circunstâncias acidentais de cada instante fornecerão resposta às suas necessidades e imaginações diversas.
Tendo aprendido a utilizar as pernas, essa criança virá a descobrir que não só pode andar, mas também correr; e não somente andar e correr, mas ainda dançar. E isto é um grande acontecimento. Ela inventou e descobriu, ao mesmo tempo, uma espécie de utilidade de segunda ordem, para os seus membros inferiores, uma generalização da sua fórmula de movimento. Com efeito, enquanto a marcha é, em suma, uma actividade monótona e pouco especializada, esta nova forma de acção, a Dança, permite uma infinidade de criações, de variações e até de figuração.

Paul Valéry, in Variéte V (pgs. 148/9).

Nota: a pintura de P. Valéry, que encima o poste, é um auto-retrato.

6 comentários:

  1. Muito interessante, quer o texto, quer a pintura. Bom dia!

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  2. Também achei.
    Marcha nunca fiz; mas andar não acho nada monótono. Mas quanto à dança, concordo em absoluto com Valéry.
    Bom dia!

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    1. Já gostei mais de andar, quanto a marchar, bastou-me a tropa...
      No que à dança diz respeito também estou de acordo, emboa não pratique.
      Boa noite!

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