domingo, 29 de maio de 2016

Recuperado de um moleskine (22)


Associações e sinestesias, na manhã

Há um sabor elástico, que se ouve no ar limpo, oriundo - vi, depois - de um traga-mundos que sobe uma ladeira de terra batida. É um carro silencioso em tudo o mais, só que os pneus de borracha densa, ao vencer a terra areenta, provocam esse ruído surdo, a meio gás.
Mas também o verde se projecta para além de si. Como se fosse de uma relva aérea, improvável, na copa alta dos pinheiros mansos que vejo da janela, ao longe. Desço a ambição, ao verde, e faço-o mais rasteiro. Pinto-lhe alguns cardos, lilazes e florais. Remato com papoilas, rubras, para dar mais cor.
Pintam a torre, por entre branco e verde escuro. Cordas do andaime oscilam ao vento, como num circo exterior os cabos do trapézio. Mas não há palhaços. A qualquer momento, no entanto, pode surgir um homem de fato-macaco, com uma brocha na mão, no ângulo da minha janela. Subindo, por artes mágicas, no elevador improvisado.

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