terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Piedosos votos, os meus


Submerso pela mediocridade do seu século XVII, do ponto de vista literário, Francisco Manuel de Melo (1608-1666) foi um dos portugueses da época que mais mundo teve, em posições altaneiras. Mas também conheceu baixas prisões (Torre Velha [Trafaria], Torre de Belém - má enxovia na altura -, o Castelo de S. Jorge) e degredo no Brasil, onde terá feito um filho e um belo soneto, pelo menos. O homem era de grande qualidade, que o próprio Quevedo reconheceu e o teve por amigo e correspondente. Para além disso, um grande escritor, com obra ampla, em português de lei.
Creio que Manuel de Melo foi arredado, ultimamente, dos programas escolares, talvez por uma simplificação provinciana e reaccionária em relação àquilo que temos de melhor. E para facilitar a vida aos meninos e meninas, a quem se quer dar sempre festa e pouco pensar. Que havemos de fazer?
Foi com alguma emoção pessoal que me dei conta que a Livraria Olisipo, no seu próximo leilão* de 6 e 7 de Fevereiro, vai leiloar (lote 540) duas cartas autógrafas do Poeta Melodino, com uma estimativa prevista de venda entre 800 e 1.600 euros. Únicas, é óbvio que as cartas serão raríssimas e poderão até ser inéditas: não as encontrei, orientando-me pela data (9 de Março de 1650 e 1 de Julho de 1651, cujo ano está errado no catálogo da Olisipo, que regista 1950 e 1951...), na edição primeira das Cartas Familiares (1664), por exemplar na minha posse, que consultei.
Em tempos infaustos, deixámos ir para Harvard (E.U.A.) a riquíssima biblioteca de Fernando Palha, com exemplares únicos e raríssimos que poderiam ter ficado em Portugal. Perdeu o património nacional.
Se eu fosse director da BNP ou da Torre do Tombo não estaria sossegado, mas nervoso. E faria tudo aquilo que me fosse possível para que essas 2 cartas autógrafas de Francisco Manuel de Melo viessem a ficar à guarda, integrando o acervo, de uma das duas instituições portuguesas. Para memória futura e consulta de quem as mereça estudar.


* ver poste, no Arpose, de 16/1/2019.

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