sexta-feira, 16 de junho de 2017

Os adoradores do Sol e os tuque-tuques


É vê-los, com pele de lagosta, em acarneiradas filas intermináveis, para visitar os Jerónimos, salivando ao Sol, em bichas serpenteando, para comer pastéis de Belém, ou acotovelando-se, como sardinhas em lata, para promíscua e trepidantemente, irem suando e sacolejando no 28, ou subirem no elevador de Sta. Justa, na simplória epifania dos simples e alumbrados.
Porque todos aceitaram, numa maciça inexistência  de vontade própria, o mesmo itinerário proposto pelas agências de viagem ou, em raríssimos casos, leram pela mesma cartilha de lugares comuns, a visitar, obedientemente.
Serão 20 milhões - dizem - os turistas, neste ano da graça de 2017, em Portugal. Em breve, nem a mais ínfima cidade de província escapará a estas hordas barulhentas em trajes quase menores, que hão-de alastrar, irremediavelmente, por todo o país, quando Lisboa e o Porto estiverem saturados e superlotados, e já não couber mais gentinha. E, depois, ainda temos de suportar os tuque-tuques de múltiplas empresas unipessoais, (disfarçadas de modernas startups, subsidiadas pelo crédito mal parado e antecipado (oh! bolha!..) de bancos muito ousados e amigos) , na sua chinfrineira perigosa pelas ruelas da cidade.



Com a sua habitual elegância, António Guerreiro aborda esta epidemia, pelo abstracto e erudito, na sua crónica semanal, hoje, na ípsilon do jornal Público. Da pequena citação, que vou fazer, aconselharia os nossos Edis-mores, das principais cidades portuguesas, a pespegá-la, bem visível e em várias línguas, no 28 e nos Jerónimos, bem como nos locais, sempre os mesmos, visitados pelos suspeitos do costume. Ora aqui vai a citação:
"É por isso muito plausível que possamos saborear em Hamburgo o melhor pastel de nata de sempre, e comamos a melhor pizza italiana em Berlim, num restaurante turco. Para partir, já não precisamos de sair; esta é a conclusão a que temos de chegar, sobretudo quando vivemos numa cidade com grande densidade de turismo."


Uma última alternativa, caso esta gente seja iletrada ou teimosa, seria metê-los à força num barco, com rumo aos Farilhões, ou em direcção às Desertas, para irem ver as cagarras. Para o caso, tanto faz. Porque eles vão continuar a ser felizes e a contar aos amigos estas surpreendentes excursões. Depois das férias, para os enciumar. É assim que a bolha continua a crescer, num boca a boca de litania progressiva. Até um dia, que oxalá não seja demasiado funesto!...

10 comentários:

  1. Caro habitante da disneilândia portuguesa: desista. Mude-se para um sítio diferente e decente. Guimarães, por exemplo. Nós, os portugueses da província, que tanto investimos aí em Lisboa, agora queremos colher os frutos. Venham os turistas! Venham as receitas! Se Portugal vai ter apenas sete ou oito milhões de habitantes, eles cabem bem no resto do território.
    Tenho dito... :)

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    1. E porque não, Sanfins do Douro, que é muito mais bucólico e sossegado?
      Porque Guimarães, desde que foi alcandorado a Património da Unesco e Cidade da Cultura, já não é o que era. Só os Paços dos Duques, em 2016, tiveram mais de 700.000 visitantes (apre!).
      Depois de ouvir os Ruis, Moreira e Rio, sobre a Agência Europeia de Remédios não ficar em Lisboa, num arroubo sentimental de regionalismo minhoto, comecei a pensar, seriamente, em emigrar para Sobradelo da Goma...

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    2. Sobradelo da Goma, mítico lugar, no sopé da Serra do Merouço. Com a sua Igreja Matriz, a Aldeia Turística de Carreira, o Parque de lazer do Pontão, as fábricas de Filigrana e vários percursos pedestres, faz as maravilhas de milhares e milhares de forasteiros, que a visitam diariamente. Sim, porque, com um terço dos seus naturais espalhados pelos quatro cantos da emigração, os poucos residentes que restam precisam de ganhar a vida.
      Costumam perguntar os velhotes, uns aos outros: então, Emília, onde estão os teus filhos? E a resposta: foram para Lisboa!

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    3. Pois ainda bem que me avisou porque, assim, vou ter de ponderar melhor, dominando o meu impulso romântico e regionalista, que me foi despertado pela veemência de Rui Rio ao defender os laboratórios de remédios da Invicta.
      Mas tenho ainda esperança de encontrar um lugar perdido, onde só ouça falar o português lídimo, velho e terroso.

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  2. Caro APS, já que vamos numa de sugestões para a sua próxima morada escolha Vila Meã em Amarante e quando lá for tomamos um café :)
    Quanto ao turismo, o que me preocupa é que fiquemos demasiado dependentes dele.

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    1. De Amarante lembro-me bem, Vila Meã lembra-me Agustina.
      Tomei boa nota e agradeço a gentileza..:-)
      É a bolha de que falo, se rebenta afoga-nos a todos...

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  3. «Não posso mais olhar» (Jorge Palma) para tanto turista. Eu que gosto tanto de ir à Baixa, agora até fujo.
    Querem os 20 milhões?! Melhorem os transportes porque isto assim não dá.
    Bom sábado! - Em Lisboa com 41 graus. :(

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    1. Os centros emblemáticos (Baixa, Chiado, Bica...) estão impossíveis...
      E acho que nada está a fazer-se contra esta inundação desmesurada. Os prços estão a subir, o imobiliário chega a preços proibitivos, a não ser para alguns nababos orientais e africanos. A rua Serpa Pinto são só obras! Os tuque-tuques, as vozes estridentes desta gentinha, pelas ruas, quase gritando, são um desassossego permanente. Ao menos que aumentem a taxa de Turismo para preços altos, a ver se restringem um pouco este tipo de turistas que estão em Lisboa, como podiam estar em Cancun ou na Praia das Galinhas...
      Estou francamente pessimista.
      Por cá, dentro de casa, já estão 28º!
      Bom fim-de-semana.

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    2. Completamente de acordo. Se tenho de sair do passeio
      para poder andar na baixa não faz sentido. Nem tenho
      de sair para não sei onde, porque as minhas raízes estão
      aqui. Outras cidades estão com o mesmo problema, só que a
      nossa baixa de Lisboa é muito pequenina.

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    3. Torna-se sobretudo urgente tomar algumas medidas que disciplinem (crédito bancário muito exigente e rigoroso para a construção de novos hotéis, regularizar drasticamente a hospedagem particular, contingentar a proliferação dos tuque-tuques, etc., etc...) o aproveitamento oportunista de alguns por esta desenfreada e nociva invasão. progressiva.

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