quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Da leitura (19)


Houve quem desse tarde por Eugénio de Andrade e a sua poesia. Não foi o caso de Jorge de Sena, mas terá havido, entre ambos, uma empatia recíproca. Uma amizade fiel. E feliz.
O traço de uma correspondência raramente é pendular. Quero eu dizer, equilibrado, sem que um dos interlocutores se subestime ou submeta ao peso do outro. Muitas vezes, há um tom predominante que desequilibra de forma flagrante essa relação humana onde se carteiam emoções, ideias, instintos, sentimentos. Quando a correspondência é literária, os perigos são ainda maiores...
Esta troca de cartas entre Eugénio de Andrade e Jorge de Sena tem, porém, um aparente selo de humana, frágil, enorme autenticidade sem pose nem resguardo - sem defesa, em suma. A verdade do que é dito não tem segundos sentidos. Por ela perpassam depressões, doenças, necessidades, aflições, algumas alegrias num registo de nudez que só podia ser o de uma grande amizade.
E delas ressuma, ainda hoje, uma atmosfera, uma ambiência que retrata o viver português (mesmo que um dos interlocutores seja expatriado), difícil, da segunda metade do século XX. Filtrado por duas grandes figuras de uma época. Nem sempre felizes...


6 comentários:

  1. Presumo que seja uma boa leitura, são dois vultos de respeito e, mesmo falando de minúcias quotidianas, hão-de ter um quê de original. Ou assemelhar-se a nós, o que nos deixa sempre um pouco contentes connosco. Do que li no diário de Jorge de Sena, pareceu-me muito igual aos demais homens em preocupações, só o pensamento vertido na escrita o distingue. Mas também é verdade que não sei de melhor distinção. Do Eugénio quotidiano nada sei. Já li num blogue que nessas cartas limita-se a falar de si mesmo. O que, penso eu, não é tão mau assim. Podemos bem falar de nós sem narcisismos exacerbados. Mas não sei. Teria de ler. E comprar. Mas por agora, "outros valores se alevantam".
    Bom Dia:)

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    1. Excelente leitura, realmente, de grande qualidade e informação.
      E o que um plumitivo expatriado disse por aí, num blogue, é uma pura tontice, que deverá ter outros motivos inconfessados...
      Não serei, porventura, inteiramente isento, porque conheci os dois poetas (Sena, apenas por carta), mas esta correspondência merece muito ser lida.
      Um bom dia, também!..:-)

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  2. Ora aí está um livro que gostaria muito de ler. A ver se o encontro quando for a Lisboa. :-)
    Bom dia!

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    1. Faz muito bem. E vai encontrar, com certeza, até porque o livro saiu há pouco tempo.
      Bom dia!

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  3. Jorge de Sena e J.Rodrigues Miguéis foram mal amados
    no seu País. Emigraram e morreram longe de Portugal.
    Eugénio de Andrade foi reconhecido em vida.
    Boa leitura.

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    1. A "novela" da Fundação Eugénio de Andrade, na sua criação, breve vida e morte teve aspectos de tragi-comédia, com responsáveis irresponsáveis... Jorge de Sena teve porém a sorte de ter Mécia de Sena para defender a sua obra, felizmente.
      Já li todo o volume. E recomendo..:-)

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