domingo, 20 de junho de 2021

3 fragmentos (traduzidos) do "Bloc-notes III" de François Mauriac (1885-1970)



Vendredi 13 septembre 1963

Este bem-estar totalmente físico, depois de uma noite em que até pouco dormi, e que eu sinto esta manhã olhando as colina em que o tempo se vai fazendo bom, faz-me admirar que me tenha sido concedido já nestes confins da vida. O nosso corpo surpreende-nos e nós debruçamo-nos atentos sobre ele, à escuta deste batimento infatigável que não pára nunca (e todavia ele cessará um dia próximo). (pg. 396)

Mercredi 18 septembre 1963

Nunca a natureza foi mais hostil ao homem, mais deliberadamente hostil do que no nosso Sudoeste, neste outono de 1963. Tenho sido muito desiludido nas minhas primaveras e outonos. As bem-amadas estações não são belas senão através dos nevoeiros da memória, confundidas com a nossa infância, com os primeiros amores - como se os desaparecidos tivessem transferido para essas estações a luz do seu olhar, o seu calor e essa ternura que nós procuramos junto dos vivos. (pg. 398)

Vendredi 4 octobre 1963

Nada se perde para sempre. As vindimas atrasadas começaram enfim sob um céu triste. O dilúvio parece ter-se interrompido. A casa assemelha-se à arca, a minha colina a Ararat e, como o velho Noé, eu abro a janela e projecto em pensamento uma pomba em liberdade por sobre o campo encharcado de chuva.
O vinho será fraco de graduação. Não importa : a colheita pode ser salva. (pg. 404)

2 comentários:

  1. Um homem um pouco desiludido da vida.
    Boa semana!

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    1. É verdade, mas 78 anos pensados não darão para grandes veleidades ou optimismos..:-)
      Retribuo, cordialmente.

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