quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Da Janela do Aposento 71: Aviso aos Incautos

 

Na sua edição de hoje, 27.10.2022, anuncia o Público uma nova iniciativa editorial, a saber, uma História do Design Gráfico em Portugal-Perspectivas Críticas, orientada pelo professor e investigador universitário José Bártolo, da ESAD-IDEA.

Da colecção de 10 volumes, certamente inserido no vol. 3, dedicado ao «renascimento das artes gráficas»:


deverá constar a seguinte referência, profundamente enganadora:


Com a imagem da edição do Reportorio dos tempos, de 1552, e, no fim do pequeno texto, a referência ao impressor Valentim Fernandes, o leitor poderá ser induzido no erro de pensar que o impresso na imagem acima terá saído dos prelos de Valentim Fernandes. Nada mais incorrecto, porque o impressor moravo, Valentim Fernandes, faleceu com data incerta, mas ca. de 1518[1]

De facto, o impresso na imagem saiu dos prelos do impressor Germão Galharde, activo em Portugal entre 1519 e 1565[i].

Ora, para quem pretende assumir o seu trabalho da colecção sobre a História do Design Português, «procedendo a uma revisão historiuigrafica [sic]» e afirme encarar os livros como valor documental, espera, certamente, o leitor rigor na citação e reprodução das fontes.

Quanto ao resto regista-se uma voluntária ou involuntária tendência, reincidente, para a óbvia falta de actualização das fontes sobre a História do Livro em Portugal, fazendo-a parar na obra de Artur Anselmo, de 1981, sobre as Origens da Imprensa em Portugal, ou recorrendo, para o título em epígrafe, o Reportorio dos tempos, às imagens de uma edição contrafeita, com data de 1518, inseridas nas páginas 356-391 da obra de D. Manuel II sobre os Livros Antigos Portugueses, de 1929.

Da minha janela do aposento apenas me resta uma profunda intranquilidade perante trabalhos de reduzido empenho na seriedade.



[i] Cfr. Helga Maria Jüsten, Para a História da Tipografia Portuguesa. A Oficina de Germão Galharde e de sua Viúva 1519 a 1565, Lisboa, Biblioteca Nacional de Portugal. Centro de Estudos Histórico. Universidade Nova de Lisboa, 2020.


[1] Sobre o impressor Valentim Fernandes existem investigações actualizadas, a saber: João José Alves Dias, No quinto centenário da Vita Christi: os primeiros impressores alemães em Portugal, Lisboa Biblioteca Nacional, 1995, bem como: Helga Maria Jüsten, Incunábulos e Post-Incunábulos Portugueses (ca. 1488 – 1518). (Em Redor do Material Tipográfico dos Impressos Portugueses, Lisboa, Centro de Estudos Histórico. Universidade Nova de Lisboa, 2009.

Post de HMJ

7 comentários:

  1. Lamentável a todos os títulos e especialmente sendo o PÚBLICO o dono da obra!
    Agradeço a informação que não acredita a iniciativa editorial.
    Um abraço.

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  2. Estes professores universitários!... Este cromo, que nem conhece a bibliografia publicada, deve dar umas aulas muito fiáveis e deve andar aí a dirigir teses, muito bem dirigidas, pela amostra junta. Meus deuses!
    Bom dia!

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    1. Para MR:
      A falta de seriedade até me incomodou fisicamente.

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    2. Acredito.
      O problema é que a mentira vai ser reproduzida. E quem a citar fá-lo-á de boa-fé, não lhe passa pela cabeça que está errado.
      Bom fim de semana!

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  3. Respostas
    1. Para Margarida Elias
      Para além de triste é vergonhoso.

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