terça-feira, 26 de maio de 2020

Apontamento 135: Retomar e Clarificar a Retrotopia




Tendo falado no livro de Zygmunt Baumann, Retrotopia, verifica-se que os pensadores actuais não ultrapassam o diagnóstico, acrescentando pouco ou nada àquilo que as pessoas esclarecidas retêm, elas próprias, deste fim de festa. Falta-lhes, certamente, coragem para tirar as devidas lições de tantos estudos citados, como é o caso do livro em epígrafe, evitando desta forma algum desencontro com os poderes estabelecidos.

Convenhamos, voltar atrás não significa regressar aos padrões miserabilistas, de bem-estar, saúde, educação e cultura dos anos 50 ou 60 do século passado, mas saber tirar lições de uma competência básica de vida e autonomia sã de pensamento. Passar do diagnóstico ao prognóstico implicava coragem e propostas claras para nos salvar destes padrões omnipotentes e neoliberais. Significava aliviar a população desta vertigem para dependências espúrias, suportada pela comunicação social e pela publicidade, no sentido unívoco de uma vida de consumo, sem qualidade, sem sentido, sem civilidade nem sustentabilidade.


Zygmunt Baumann, 1925-2017


Resultado deste enorme desencontro mental, para não chamar estado esquizofrénico, é o que acontece, neste momento, com as companhias aéreas. Aceitam elas, com o consentimento do poder (?) político, uma injecção de capital público, indispensável à sua sobrevivência, rejeitando, de todo, uma regulação em função dos fundos recebidos. “Não haverá melhor investidor”, como diria um jornalista do DIE ZEIT, sublinhando o enorme defraudamento dos contribuintes.

Sem pretender fazer publicidade a um grupelho completamente execrável, que dá pelo nome de Ryanair, conspurcando com a sua postura rústica a imagem de uma país estimável como a Irlanda, vamos ter, com a mesma falta de coragem, uma Comissão da EU a ceder a estes “lobbies”, sancionando viagens de avião sem a obrigatoriedade de manter o devido espaço social de distanciamento (1,5 a 2,00 m), recomendado para os restantes espaços públicos.

A Retrotopia, ou uma outra racionalidade, começaria por um novo modelo, retomando a vertente intrínseca do Turismo, de cultura e civilidade, como via de conhecimento e convivência. A nobreza de viajar para conhecer nada tem a ver com as HORDAS que se preparam, nos confins dos seus tugúrios confinados, a embarcar, de qualquer maneira, rumo aos locais publicitados. Incompreensivelmente, os poderes políticos perfilam-se para acolher de novo os transeuntes indiferenciados em detrimento do valor supremo da saúde pública.

Oxalá que as pessoas, a troco de uns empregos precários e mal-pagos, não se arrependam de tanta liberalidade e de se subjugarem à publicidade enganosa.

Post de HMJ

3 comentários:

  1. Pelo que me pareceu, o livro foi uma desilusão.
    Não sei se vai haver muita gente a viajar de avião nestas condições. Pelo menos, espero que não haja.
    Bom final de tarde!

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    1. Para MR:
      Pois foi uma desilusão. Estamos sempre à espera de um pensamento mais elaborado. Pelo menos fiquei esclarecida sobre o posicionamento do autor, embora informado e não alinhado com a corrente neoliberal, não se revela arrojado ou inovador quanto ao futuro. Conclusão: Leitura feita, registada, pode ir para a estante ou outro leitor interessado.
      Por enquanto, e acompanhando o centro da Europa falante de Alemão, considero que, neste momento, estamos numa situação privilegiada: do ponto de vista democrático, político, de saúde e até de cultura. A invasão de conspirações, manifestações de poderes ocultos, pretensos defensores da Constituições com raízes fascistas e racistas, são aspectos que me preocupam sinceramente. Nunca pensei que a EDUACAÇÃO tivesse sido tão ineficaz, na Alemanha, para fazer surgir um mundo completamento tolo, desinformado, pernóstico e, quiçá, incontrolável.
      Estou preocupada.

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  2. Errata:
    A resposta anterior devia ser de HMJ e não de APS.
    Onde se lê: da Constituições deve ler-se: das Constituições e também EDUCAÇÃO em vez de EDUACAÇÃO.

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