Os peixes
são cépticos.
Já viveram neste mundo
e sabem o que lhe falta;
como poderiam eles evitar
o desejo e o medo,
magoando-se pelo mistério do vidro,
nas vibrações da minha voz, pelas minhas mãos desastradas,
se não tivessem atingido
uma distanciação real?
Pergunto-me muitas vezes o que pensam eles percorrendo
a superfície do bocal; observei-os, procurando um clarão de fé,
impaciência, terror, consternação, alegria
- mas nada transpira, nem mesmo
a memória.
Durante todo este tempo, creio
que nunca terão adormecido,
por isso, nunca sonharam
- a menos que o sonho deles seja aquilo
que eu já nem vejo, cenário veloz de que se duvida:
a mesa à entrada, a segunda passagem do correio,
as luzes do outro lado do estuário, o prado vazio,
as crianças que regressam a casa, chamando no escuro,
o perfume do teu lenço ao pescoço
temperado pela chuva.
Nota: o poeta escocês John Burnside nasceu a 19 de Março de 1955 e foi galardoado com o prémio T. S. Eliot, em 2011. O poema, traduzido da versão francesa de Françoise Abrial, pertence ao livro "A Normal Skin", de 1997. O quadro, em imagem, é de Matisse.
Fartei-me de matar peixes com excesso de comida.
ResponderEliminarGostei deste poema de um poeta que desconheço. E da ilustração.
Também não fui muito feliz com os peixes que tive, meus e dos meus filhos, mas não terá sido por excesso de rações..:-(
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