quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Toponímia, apropriação e bairrismos


Quando tudo parecia ter serenado e, talvez por não ter nada para dizer, eis que a SPA (Sociedade Portuguesa de Autores) levanta a bandeira e vontade de levar para o Panteão Nacional os restos mortais do cantautor anti-fascista José Afonso (1929-1987). E porque não Jorge de Sena ou Eugénio de Andrade? Talvez, simplesmente, porque não estavam inscritos na agremiação e teriam pertencido à rival APE (Associação Portuguesa de Escritores), muito mais discreta, em iniciativas. Por vezes, as coisas têm razões outras, dissimuladas, duma simplicidade desarmante e notória...
O país é pequeno, em território, e frequentemente, também em mentalidades. E, depois, quase todos se conhecem. Na minha zona outrabandista, o nome de Petrónio Amor de Barros (?) é larga e generosamente celebrado na toponímia local. Pelo menos, numa rua longa e airosa, bem como numa praceta modernaça. Ao contrário, o poeta maior Eugénio de Andrade (1923-2005) teve direito apenas a figurar numa rua escusa, pequena, quase desurbanizada, que mais parece um beco envergonhado e sujo, com duas ou três casas pobres.
Louve-se entretanto, por notícia de última hora, que a família de Zeca Afonso "rejeita a trasladação para o Panteão", do seu célebre familiar. Honra lhe seja!

8 comentários:

  1. Eu achava bem. A família deve ter rejeitado porque ele tinha horror a estas celebrações e também porque acaba a polémica que se iria iniciar e imagino os 'mimos' que iriam ser ditos.
    Bom dia!

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    1. Eu penso que temos de usar de sobriedade e rigor, nestas coisas. Dar tempo, para pôr de lado as tentações "clubistas", tanta vez partidárias e emotivas.
      Não conheço as razões que a família de Zeca Afonso invocou, para recusar. Mas aprovo a atitude.
      Retribuo, cordialmente.

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  2. Bem que "googlei" o Petrónio, mas não ficou para a história (ainda irei ver lá em casa em papel, se aparece alguma informação sobre...). O Zeca Afonso recusou todas as honras estatais em vida. A Sociedade Portuguesa de Autores esqueceu-se de se informar antes, ou tem responsáveis de memória curta.
    Bom dia

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    1. A SPA sempre foi uma empresa de sucesso, sobretudo com a presidência de Luis Francisco Rebelo, que era um bom homem de Teatro. Ao que parece, nem sempre olham a meios, lá na sociedade... Seria avisado, prudente e ético que, antes de fazer o anúncio bombástico, o inefável Letria consultasse, primeiro, a Família de Zeca Afonso, para divulgar a intenção. Mas com isso perdia-se talvez a retumbância e a primeira página de alguns jornais. A intenção devia ser outra!
      Boa tarde.

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  3. Sinceramente já me chega o calor para me pôr de mau humor e nem
    perceber como algumas parvoíces vêm a lume. Para mim nem faz sentido
    a ida de quem quer que seja para o Panteão, muito menos José Afonso
    que pela sua forma de vida aceitaria esta "honra". E a silly season que
    nunca mais acaba! Desejo-lhe uma boa tarde.

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    1. Zeca Afonso tinha expressado a vontade de ficar em campa rasa. Vivo, recusara a Ordem da Liberdade. Era um homem sério que recusava as mundanidades e a pompa. A SPA estudou mal a lição ou não fez o trabalho de casa, que lhe competia...
      Uma boa noite, fresca.

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  4. O Zeca já morreu há 31 anos. Já passaram alguns anos. Acho que merecia estar no Panteão. Deve ter sido o primeiro a dar a conhecer a muita gente a poesia de Jorge de Sena. Mas se ele não queria (como eu imagino que não) e se a família é contra, a SPA só tem de dar o caso como encerrado.
    Não acho que o José Afonso na cultura portuguesa que é feita de muitas variantes (não só a literária) seja menos merecedor que o Jorge de Sena ou o Eugénio de Andrade. No Panteão, do meu ponto de vista, devem estar os nossos heróis. E eu nem sempre acompanhei as posições que ele tomou. Mas quem declarou em vida como queria ser sepultado, devemos respeitar a sua memória.
    Boa noite!

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    1. Ronaldo é um dado adquirido, depois de Eusébio, a menos que o madeirense recuse, previamente. Pelo mesmo critério de "mãos rotas" (com que eu não concordo, evidentemente) por que não José Mourinho?
      Ou levamos as coisa com rigor ou, qualquer dia, o Panteão está cheio de figuras que, dentro de 50 anos, ninguém sabe quem foram, como o Petrónio Amor de Barros que, aqui na zona, deu nome a uma rua e uma praceta.
      Se, porventura não tivesse acontecido o 25 /11/75, provavelmente Vasco Gonçalves também iria para o Panteão... É contra estes frenesis apressados e clubistas que eu estou contra. Há que dar mais tempo e distância para decisões serenas, credíveis e de algum rigor racional e histórico.
      Uma boa noite.

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