O gosto que tenho por conhecer expressões castiças e regionais, bem como o decorrente convívio com monografias de terras portuguesas que, normalmente, abordam ou contém anexins e regionalismos localizados, autoriza-me chegar a algumas conclusões. Uma delas é que muito do que consta como falares regionais, em livros, é também comum a outras terras e outras gentes portuguesas; e alguns dos regionalismos não o são, como criação pura e original, mas apenas corruptelas de expressões ou de palavras da língua portuguesa que o povo adaptou a um falar mais simplificado. É, por isso, necessário separar o trigo do joio e mondar, assim, o que é espúrio, para destacar apenas aquilo que é essencial e verdadeiro regionalismo.
Falei, há cerca de um mês (14/7/2018), aqui no Arpose, de um livro que me fora oferecido, pelo meu amigo AVP, intitulado Palabras co bento no leba, de Domingos Freire Cardoso, que colige ditados, expressões e regionalismos de Ílhavo e da sua zona. Dele, vou seleccionar alguns termos, que me pareceram mais interessantes e/ou originais, começando, cronologicamente, por palavras iniciadas pela letra A, e dando o seu significado a seguir. Assim:
1. À patarrôlo - em grande abundância.
2. Acatafegar - ter dificuldade em respirar.
3. Acuzapar-se - sentar-se.
4. Amarafundado - cheio de trabalho.
5. Andar à galipa - andar à bulha, à pancada.
6. Andar num badanau - andar muito atarefado.
7. Anhuca - pessoa que confunde tudo.
8. Arroz de molho pardo - arroz de cabidela.
9. Atentarete - diabito, arreliador.
10. Aucalité - coisa sem importância.
O "anhuca" é-me muito familiar, sem que tenha ligações ilhavenses. Usava-se muito lá por casa para designar alguém atrapalhado. As outras são uma novidade e se há coisa que sou incapaz de comer é o tal "arroz de molho pardo".
ResponderEliminarBom dia
É bem provável, então, que o "anhuca" não seja, castiçamente, oriundo de Ílhavo. Quando eu não conheço a expressão, tenho-a como legítimo regionalismo, mas também me posso enganar...
EliminarQuanto ao arroz de cabidela, sou fã..:-)
Bom dia.
EliminarAcho que só conhecia «À patarrôlo» e «Anhuca», mas chegaria ao sentido de muitas delas. A minha preferida é «Acuzapar-se». :)
ResponderEliminarBom dia!
Vou atrás da sua preferência..:-)
EliminarE vão 2 que, se calhar, não são absolutamente ilhavenses.
Bom dia.
Anhuca é a única que conheço. Mas acho graça
ResponderEliminarà palavra "Acuzapar-se".
Pois eu, nem essa conhecia...
EliminarMuito menos a segunda, a que também achei piada.
Como autor do citado livro permitam-me uma pequena achega. Não é "à patarrôlo" mas sim "a patarrôlo".
ResponderEliminarProvavelmente o acento circunflexo está a mais mas eu abusei dos acentos, mesmo dos nitidamente desnecessários porque daqui a uns anos poderá não se saber qual era a pronúncia usada.
Quanto a uma palavra ou expressão ser ou não originária de Ílhavo tenho a dizer o seguinte: saber o que era originário de Ílhavo (ou saber o que devia ser incluído ou retirado do livro) foi a decisão mais difícil que tive de tomar durante a preparação deste trabalho.
Na dúvida, orientei-me sempre por este princípio: pode não ser originária de Ílhavo mas dizia-se aqui.
Palavras que eu penso serem tipicamente ilhavenses (pelo menos não conheço que se digam noutras regiões) são, por exempo: beleira, caniné, còdre, comedeiraça, escufenar (escufenadeira/ escufenadeiraça), estrampadeira, gobernadeira (gobernadeiraça), imboitar, imprir, injorcar, pelingrino, sible e simprinhas. Este "simprinhas" é, quanto a mim, a palavra mais típica de Ílhavo e a que melhor o/a caracteriza.
Para além destas palavras cito mais 35 corruptelas/ casos que fazem o linguajar de Ílhavo ser diferente de outros que conheço.
Estou ao dispor de todos para esclarecimentos adicionais. Façam o favor de dispôr do que andei a recolher durante cerca de cinco anos. Estejam à vontade...
Atenciosamente.
Antes de mais, muito lhe agradeço o comentário e a disponibilidade com que referiu algumas precisões do seu monumental trabalho, que nunca será de mais enaltecer. Essas indicações suas vieram enriquecer o meu despretencioso poste e palavras. Porque estas obras, como esta sua em livro, de intenso e aturado labor, são normalmente desinteressadas, mas demonstram, pelo menos, o amor à terra que nos viu nascer, ou onde nos criámos.
EliminarDas palavras que refere, como tipicamente de Ílhavo, apenas "injorcar" me parece ser uma corruptela de "enjorcar", que o Dicionário de Morais regista com o significado de: "Vestir, arranjar mal e à pressa, atabalhoadamente. Fazer qualquer coisa mal; atamancar." Todas as outras, que cita, eram para mim totalmente desconhecidas.
Agradeço-lhe também a generosa liberdade com que me autoriza a prosseguir na divulgação espaçada e parcial do seu trabalho aturado e valioso.
Muito cordialmente,
Alberto Soares
O que pode desejar um autor se não a divulgação do seu trabalho? Além disso, já alguém disse que, depois de publicado, um livro já não pertence ao seu autor mas ao público. Por isso, pode dar o uso que entender ao que escrevi, na certeza que tenho de que isso só enriquecerá o que escrevi dada a competência que lhe reconheço e que é confirmada pelo nosso amigo conumm Agostinho.
EliminarComo pode ver pelo livro, o povo substituía o começo das palavras em "en/ em" por "in/ im". Daí o "injorcar"...
Atenciosamente.
Grato por mais este esclarecimento, da sua parte, que explica a variante de "injorcar". Estou certo que este diálogo acabou por ser útil para ambos e veio enriquecer o poste.
EliminarOs meus melhores cumprimentos, e votos de um bom fim-de-semana.
Gostei muito! Gosto sobretudo do amarfundado :-) Bom fim de semana!
ResponderEliminarAinda bem que gostou porque, em tempo, há-de haver mais..:-)
EliminarIgualmente, e boas férias.
Conhecia o "acuzapar" e "andar num badanau". Anda tudo num badanau por causa de...é uma expressão que uso/oiço de vez em quando.
ResponderEliminarEstes posts são interessantes:)
Boa noite:)
Pois eu estava "virgem" a todos estes regionalismos..:-(
EliminarBoa noite.