terça-feira, 28 de agosto de 2018

Memória 123


Eu creio que terá sido em finais dos anos 50 que eu assisti à primeira Ópera, completa e ao vivo. Improvavelmente, integrada nos Festivais Vicentinos, no pátio dos Paços dos Duques de Bragança, numa cálida noite de Verão, em Guimarães. Ia, na presidência da autarquia, o esclarecido e culto Dr. Castro Ferreira, pai do meu grande amigo Chico, já falecido. Provavelmente, no programa cultural previsto para esse ano, teria sido ajudado a concebê-lo por outro médico, de grande craveira intelectual, embora mais discreto de feitio - o Dr. Carlos Saraiva. Também ele pai de outro grande amigo meu, felizmente, este, ainda vivo e de boa saúde, que é da minha colheita cronológica, em idade.
Sabia eu lá, noviço e adolescente, quem era Gioachino Rossini (1792-1868)!? A ópera era, nada mais nada menos, que "O Barbeiro de Sevilha", de que eu gostei imenso, na altura. Mais tarde, talvez em 1963 ou 1964, já em Lisboa, ali pela Av. Miguel Bombarda, Rossini viria a cruzar-se comigo, de forma avassaladora, através de um LP maravilhoso. Com as suas aberturas de ópera, mais famosas e tonitruantes. Até porque vibravam em uníssono com a minha tumultuosa juventude, como todas sempre abertas ao excesso, ao heroísmo, ao tom épico da vida a acontecer. Vim a saber depois, que Rossini fora também um homem generoso, amigo do seu amigo, gastrónomo nato. E bom cozinheiro.
Descobri, ainda mais tarde, que o grande compositor italiano tinha, também, composições musicais de grande finura e sensibidade, como esta:

Acrescente-se, porém, que também os grandes génios podem errar. Rossini, bissexto de nascimento (29 de Fevereiro de 1792), encontrou-se, em 1822, com Beethoven, que lhe deu um conselho prudente, assim: "Ah! Rossini. Então foi você que compôs «O Barbeiro de Sevilha». Dou-lhe os meus parabéns. É uma obra que será sempre tocada e cantada, enquanto houver ópera em Itália. Mas não tente compor nada que não seja opera buffa; qualquer outro estilo não vai bem com a sua natureza."

6 comentários:

  1. Sempre achei que a ópera devia ser apreciada ao vivo. Tal não é possível, a maior parte das vezes. Quer os meus pais, quer a escola foram uma fonte de educação musical e devo em parte a uma amiga/colega de escola, que aprendia piano, o começar a ir ver os concertos do Maestro Atalaya (a la Bernstein) e a assistir a algumas óperas (as borlas da rádio sabiam mesmo bem, mas ai de mim que não fosse bem vestida, ou a minha mãe não me deixava ir, impossível pensar em ganga para um teatro). Rossini é dos meus favoritos. Esta fantasia é magnífica e é a prova que até os génios podem não estar inspirados nas opiniões.
    Boa tarde

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    1. Ao vivo, ganha realmente outra convicção, porque, muitas vezes os libretos são muito datados, mesmo que os cenários possam actualizar-se para o presente, através de uma boa encenação.
      Não me posso inteiramente queixar, embora a minha convivência com a música erudita tenha sido um pouco bissexta. Só aos quarenta comecei a conhecer melhor Liszt (através de um CD, de Louis Lortie, com a "Pelegrinage"), que é um dos compositores que mais aprecio, ainda hoje.
      Uma boa noite.

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  2. É um pouco estranho, mas não me é fácil associar um gastrónomo
    a compositor de música clássica. Essas pequenas histórias poderão
    ou não ser reais, mas Beethoven, ligar o estilo de música com a natureza
    de Rossini não me parece muito lógico.

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    1. O gosto por comer, de Rossini, é comprovado, e o compositor apreciava, sobretudo, trufas e "foie gras". O "tornedó Rossini" é uma homenagem ao seu lado de "gourmet", e terá sido criado por um cozinheiro francês.
      Quanto à história do encontro Beethoven/Rossini contei-a, tal como a li, embora não possa assegurar a sua veracidade.

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  3. Não tenho a mínima dúvida sobre a veracidade do teor
    do poste. Eu sabia que Rossini foi um "gourmet".
    Talvez a maneira de me exprimir não seja a ideal, por
    isso peço desculpa, mas tenho sempre um grande apreço
    por tudo o que aqui escreve.

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    1. Não há qualquer problema, Maria Franco.
      E já agora aproveito para lembrar outra homenagem gastronómica, a Nellie Melba, cantora australiana, por parte do cozinheiro Escoffier, com o seu celebrado "Pêche Melba".
      Renovo os votos de boa noite.

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