Era enorme e de carnes mal arrumadas. Embora não fosse alto nem excessivamente gordo, era corpulento pela ocupação do espaço quadrangular do corpo. Compensava, entretanto, por alguma elegância de gestos, que nunca eram amaneirados. Nunca cheguei a saber se era viúvo, divorciado ou simplesmente solteiro, mas o asseio da roupa sempre escura e as calças bem vincadas, denunciavam que havia alguma mulher cuidadosa, lá por casa, ainda que fosse a dias.
Irmão de um médico célebre, hoje, com busto numa rua lisboeta, M. da Rocha era apenas veterinário, o que, naqueles anos aristocráticos do ancien régime, era considerado um curso de segunda. O seu trabalho, na área da segurança e qualidade alimentares era, no entanto, louvado e enaltecido quanto à seriedade, isenção e rigor das decisões que tomava. O desrespeito da administração por um seu relatório (que mandava abater largas centenas de quilos de peixe, por impróprio) numa empresa de congelados, de dimensão nacional, levou-o a pedir a demissão.
E embora estivesse em vésperas dos 60 anos, não esmoreceu. Manteve a sua dignidade e sustento sobrevivendo de pequenas avenças ao serviço de pequenas sociedades de comércio alimentar. E continuou de calças vincadas, na perfeição. E de lenço branco no bolso da lapela do casaco escuro, como se nada se tivesse passado de dramático, na sua vida.
Estou a ver o 'estilo' do senhor. :)
ResponderEliminarSe calhar comemos algum desse peixe impróprio...
Bom dia!
Quem sabe...
EliminarMas um dos CEO da empresa de congelados também não teve grande sorte: foi abatido, ao sair de casa, pelas FP-25.
Boa semana.