Se um poema breve pode provocar, num leitor atento, um coup de foudre instantâneo e fulminante, um extenso poema, se for bom, é como uma flor que se vai abrindo, lentamente, e nos vai conquistando, pouco a pouco, pela sua beleza. É o caso, por exemplo, de Anabase, de Saint-John Perse, ou do fragmento inacabado de Endymion ("A thing of beauty is a joy forever..."), de John Keats.
Li, hoje, para alguém muito jovem, e em voz alta, o poema Tabacaria, de Fernando Pessoa. Eu próprio fui sendo envolvido nos seus versos, apesar de já o ter lido muitas vezes. E o poema envolveu, também, a juventude de quem o ouviu. Mesmo que o Dono da Tabacaria (com maiúsculas iniciais, no original) seja Deus (como alguns sugerem), não é por isso que este longo poema de Pessoa nos conquista. Algo de mais profundo se insinua, apesar do dramático final:
"..., e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu."
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